‘O engenheiro era ele’: vizinho que preparou terreno para castelo de José Rico revela sonhos do cantor com gravadora e hotel no local


Moradores do bairro lamentam abandono atual da mansão que o cantor deixou e relembram laços afetivos que ele mantinha com o imóvel e com os vizinhos. Em meio a imbróglio judicial e sem moradores, “Castelo” do cantor José Rico tem sinais de abandono
Arquivo pessoal
Vizinhos do “castelo” de R$ 15,1 milhões e mais de 100 quartos deixado pelo cantor José Rico, da dupla Milionário & José Rico, que morreu em 3 de março de 2015, aos 68 anos, lamentam a situação de abandono do imóvel e detalham que o artista era o “engenheiro” da obra, que durou 24 anos e nunca foi finalizada.
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Moradores do bairro que tiveram amizade com Zum, como ele era chamado, contam que ele sempre estava com uma ideia diferente, como a construção de uma gravadora e uma loja com produtos da dupla no local.
O imóvel, que é conhecido como o “castelo do José Rico” devido ao formato arquitetônico, não é mais habitado por familiares do artista e, desde maio de 2023, a Justiça tenta vendê-lo para quitar dívidas trabalhistas deixadas pelo cantor, mas não surgiram interessados.
Em meio a impasse judicial, ‘Castelo’ do cantor José Rico acumula sinais de abandono
De ‘casinha’ para quatro andares
O citricultor Pedro Biazotto, que tem 73 anos e morou a vida inteira no bairro do Jaguari, onde José Rico construiu seu “castelo”, foi o responsável pela terraplanagem do terreno para a obra da mansão.
“Ele apareceu aqui um dia do nada. Isso foi em 90, 89. E pediu para eu limpar um capim lá para ele tacar fogo. Aí eu fui lá, limpei lá um pouco, ele tacou fogo, sumiu. Aí um dia ele voltou para mim fazer a terraplanagem, a gente combinou e eu fiz”, resume.
Ele recorda que o imóvel foi crescendo aos poucos.
“Cada dia ele tinha uma ideia. Ele começou com dois andares. No fim, fez quatro”, relembra.
Imagens mostram sinais de abandono em ‘castelo’ de José Rico, em Limeira (SP)
Essa ampliação gradativa também é relatada pelo aposentado Paulo Santarosa, de 62 anos, que é vizinho do “castelo” e foi amigo de José Rico.
“Ele fez a casinha pro pai com a mãe dele primeiro, atrás. Depois, ele começou a fundação do ‘castelo’, fez uma casinha lá pra baixo, e começou a fazer a construção e terraplanagem”, conta.
Palo Santarosa mora a poucos metros do ‘castelo’ de José Rico e foi amigo do cantor
g1
‘O engenheiro era ele’
Os vizinhos e amigos também lembram que as ideias do que fazer no imóvel surgiam do próprio José Rico. “O engenheiro disso aí é ele. Foi muito [pedreiro] que trabalhou [na obra]. Cada mês, 15 dias era um”, conta Pedro.
“Ele fez do gosto dele, mas nunca se importou com planta, ter um engenheiro pra acompanhar. Era ele o engenheiro. Ele e os pedreiros dele que sempre andaram com ele até que ele tava vivo”, confirma Paulo.
Veja comparação da área da mansão de José Rico com outros castelos do mundo
g1
Projetos de gravadora, hotel, shopping…
Embora tenha realizado alguns de seus sonhos para a mansão, como o formato arquitetônico de castelo, ter um campo de futebol com arquibancada dentro e uma piscina em formato de viola, outros sonhos o artista não teve tempo de realizar.
“Ali, ele tinha um sonho até de fazer gravadora, hotel. Ia ser a pousada do Zé Rico. Esse negócio de gravadora, ele queria ter a dele, né? Era um sonho dele”, revela o autor da terraplanagem.
Em entrevistas, Moysés Rico, um dos filhos do músico, detalhou que a intenção de seu pai era ter o hotel para hospedar músicos que fossem utilizar sua gravadora.
Já Pedro relembra de um desejo de criar uma loja com produtos relacionados à dupla sertaneja. “O sonho dele era fazer o shoppingzinho pro lado de cima pra vender as roupas da dupla. Tudo que fosse dos dois”.
José Hermano, que mora a duas casas do ‘castelo’, diz que é ‘triste de ver’ situação atual do imóvel
g1
Tristeza com o abandono
O auxiliar de produção José Hermano, de 56 anos, mora a duas casas de distância do “castelo”. Embora tenha se mudado para o local há apenas um ano, ele é fã de Milionário e José Rico e não esconde seu lamento pela situação de abandono da mansão.
“Eu torceria que isso aí não ficasse dessa forma, tão jogado como tá. Ele não conseguiu realizar o sonho dele, né? Então, a gente fica muito triste de ver uma coisa daquela ali meio jogada”.
Ele chama a atenção para o fato de que, nos fundos da propriedade, há um portão derrubado.
Área lateral do castelo de José Rico, em 2014 (à esq.) e atualmente (à dir.)
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“[O sentimento é de] tristeza. Tristeza porque ele tinha um amor com isso aí que era fora de série. Então, tristeza pela situação que está ali”, lamenta Paulo Santarosa.
Pedro, que conhecia bem o terreno antes do começo da obra, destaca a ocupação da propriedade pela vegetação.
“Acabou tudo em nada, porque aquilo ali, se você entrar ali, você vê as árvores que tem dentro, virou uma floresta aquilo ali. Só tem uma árvore ali que quando construiu ele deixou. O resto foi tudo nascido depois”.
José Rico durante show na Festa do Peão de Barretos
Érico Andrade/G1
Lembranças de amizade e humildade
Por outro lado, os amigos relembram com carinho da presença de José Rico no bairro, convivendo com os vizinhos, fosse no comércio local ou no campo de futebol.
Denisval Alves Lisboa, de 78 anos, dono do Bar do Baiano, conta que José Rico gostava de jogar futebol com os vizinhos. E que ia até seu bar durante a tarde, mas só ficava enquanto tinha conhecidos no local. “Dava a linha [ia embora] porque ficava com medo de pessoas estranhas”.
Bar do bairro onde José Rico costumava frequentar, segundo o dono Denisval
g1
Questionado sobre o “castelo”, ele demonstra mais a falta do “engenheiro” dele. “Todo mundo que vai, a gente sente a falta, né?”.
Paulo se recorda das paradas de Zum em uma barraca de laranjas que ficava na rua.
“O Zum era muito bom de papo. Vivia aqui. Chegava de show, ele andava pela estrada aqui à noite. Amizade tinha, sempre teve, desde o começo. Pode perguntar pra qualquer um do bairro aqui”.
Ele se lembra, inclusive, do que incomodava o cantor nos momentos de descanso. “Se queria tocar ele embora, pedia para ele cantar uma moda. ‘Cantar era só ganhando’, ele falava. Do mais, ele era espetacular. Eu tenho saudade. Vai ficar um buraco na raiz sertaneja”, lamenta.
ARQUIVO: Veja reportagem do Fantástico no “castelo” de José Rico, em outubro de 2014
Sem novo leilão ou venda previstos
A Justiça já ofereceu o “castelo” em dois leilões e duas vendas diretas, mas não houve interessados. A ação foi movida na Justiça por um músico que trabalhou com a dupla sertaneja entre 2009 e 2015 e aponta que tem débitos a receber.
O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) informou ao g1 que não há previsão de novo leilão.
“No momento, este bem ficará em suspenso, ante a existência de outros imóveis que estão sendo analisados para penhora”, explicou, em nota.
Comparação mostra como mato alto avançou sobre mansão deixada pelo cantor
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Em processo de regularização, diz prefeitura
A Prefeitura de Limeira informou a reportagem que, atualmente, o imóvel está em processo de regularização fundiária, ou seja, a área já deixou de ser rural, porém ainda não foi enquadrada como urbana.
“O local é classificado como Zona de Urbanização Específica. Enquanto esse processo não for concluído, o imóvel segue vinculado ao Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária]. Nesse caso, não é possível cadastrá-lo no âmbito municipal para efeitos de IPTU, bem como para notificação de limpeza”, acrescentou.
Área onde ficava piscina em formato de violão na mansão
Arquivo pessoal
‘Caso bem complicado’, diz filho
Em entrevista ao site Observatório dos Famosos, Moysés Rico, um dos filhos de José Rico, afirmou que a propriedade está “embargada” devido à ação trabalhista.
“É um caso bem complicado, mas ele ainda está bloqueado, esperando. A parte do leilão encerrou, mas ele está encerrado, não podemos fazer nada”, comentou ao portal.
A reportagem tentou contato com dois advogados que representam Berenice Martins Alves dos Santos, viúva de José Rico. Um deles informou que não tem nada a declarar sobre o caso e outra defensora não retornou à tentativa de contato.
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