Bolsa Família, uma emergência de 20 anos

O Bolsa Família completa 22 anos em 2025, atingindo recordes de contingente de beneficiados e valores gastos nos últimos tempos.

O objetivo do benefício social é de dar um suporte aos mais pobres, auxiliando no combate à fome e, idealmente, promovendo a chamada mobilidade social.

Economistas ouvidos pela CNN ressaltam a importância do programa, mas apontam que ele ainda não conseguiu interromper a transmissão da pobreza entre as gerações.

“Eu não diria que [o Bolsa Família] tropeçou, ou pelo menos que não tropeçou sozinho. O fato é que o Brasil tem enfrentado nos últimos 30 anos um ritmo de crescimento muito baixo. Toda vez que se forçou aconteceu uma crise pós-crescimento, o que é semelhante ao que vemos hoje”, indica Paulo Tafner, presidente do Instituto de Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS).

“O fato é que a economia brasileira não teve o desempenho razoável para tirar a gente estruturalmente da pobreza. A melhor forma de tirar as pessoas da pobreza é a geração de emprego. Há as características do Bolsa Família, que apesar de ter porta de saída, ou seja deveria auxiliar as pessoas para, além de sobreviver, criar filhos que possam ser inseridos no mercado de trabalho e romper este ciclo de trabalho”, afirma.

Fabio Giambiagi, economista e pesquisador do FGV/Ibre, ressalta que, ao comparar os períodos de 2019 e 2023, “todos os indicadores são unânimes ao mostrar que houve uma redução muito significativa do grau de pobreza e miséria”, destacando sobretudo a renda média no país e o momento do mercado de trabalho.

Porém, Giambiagi diz que o programa não atua com seu potencial máximo de eficiência, uma vez que ainda atende um público que não precisaria mais do benefício.

Apesar da melhora de uma série de indicadores no período apontado pelo economista, o contingente de pessoas beneficiadas pelo Bolsa Família saltou cerca de 26% entre o último ano antes da pandemia e janeiro de 2025.

No meio da crise decorrida da Covid-19, o Bolsa Família foi transformado em Auxílio Brasil, teve seu valor reajustado de cerca de R$ 200 para R$ 600 e facilitou a adesão ao programa de assistência.

Da maneira como se configura o benefício hoje — com contingente e valor repassado considerado elevado por especialistas —, Giambiagi aponta que, se mantido assim por muito mais tempo, o programa “arrebentaria com as contas públicas brasileiras”.

De 2008 até 2023, o gasto com o Bolsa Família subiu de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) — a soma de todas as riquezas produzidas no país — para 1,5%, o equivalente a R$ 172,5 bilhões.

“Dado o grau de desequilíbrio fiscal do Brasil, é impossível de manter ao longo do tempo sem que isso gere uma trajetória explosiva da dívida pública, o que nunca acaba bem”, afirma o economista do FGV/Ibre.

“Então, este esforço de contenção fiscal, que deverá perpassar este governo e o próximo, independente de quem vencer, não vejo como o Bolsa Família não dar a sua cota de contribuição”, conclui.

Como reverter a situação?

Para os economistas, a resposta para reverter a situação está em trabalhar a eficiência do programa para que ele possa trazer um desenvolvimento socioeconômico real às pessoas.

“O programa do Bolsa Família não é exatamente o único possível canal de interrupção da pobreza. Ele não é suficiente em si, precisa de outras políticas públicas que, aliado a um cenário de crescimento econômico, de geração de empregos, isso possibilita que as famílias saiam do ciclo da pobreza”, pontua Daniel Duque, do Centro de Liderança Pública (CLP).

“A porta de saída nunca é somente o Bolsa Família. As famílias atendidas pelo programa também precisam contar com uma educação de qualidade, saúde de qualidade, saneamento básico e, a partir do momento que vão para o mercado de trabalho, achem um emprego que as tire da situação de extrema pobreza.”

Giambiagi e Tafner concordam que o programa também precisa ser pensado de um modo que não desestimule a pessoa de buscar emprego.

Estudo coordenado por Duque indica que, com os valores atuais do benefício, participar do programa de transferência de renda pode acabar sendo mais atraente do que ingressar no mercado de trabalho.

Giambiagi ressalta que é necessário observar quais famílias que, apesar de terem conseguido entrar no mercado de trabalho, ficariam na miséria sem o Bolsa Família. Isso, pois, apesar da regularização, seria necessário um acompanhamento, um processo de transição, até que aquela família possa de fato deixar o programa social.

“O que tem que se disseminar no governo e na sociedade brasileira é ter um programa inteligente. Manter o benefício por um tempo mesmo que a pessoa esteja empregada, se não desincentiva. Tem que focar nas pessoas que mais efetivamente precisam”, enfatiza o economista do FGV/Ibre.

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Este conteúdo foi originalmente publicado em Bolsa Família, uma emergência de 20 anos no site CNN Brasil.

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