Quem foi Cornélio Pires, ‘criador’ do sertanejo ao gravar pela 1ª vez uma música caipira em disco


Na semana da Festa do Peão de Barretos e em homenagem aos 95 anos da primeira gravação de uma canção sertaneja no Brasil, g1 conta essa história em uma série de quatro reportagens. Cornélio Pires, que ficou conhecido como ‘criador’ da música sertaneja
Acervo/Pedro Massa/Instituto Cornélio Pires
Um homem do interior que, apaixonado pela cultura caipira, lutou com as próprias mãos – e o próprio bolso – para que uma gravadora aceitasse registrar a primeira música sertaneja do Brasil, em 1929, e, com isso, criou e influenciou por décadas o gênero musical mais ouvido do país. Só por essa descrição, a relevância de Cornélio Pires na cultura brasileira seria enorme. Mas não foi só isso. Paulista de Tietê (SP), o escritor tem uma bandeira de pioneirismo em diversas áreas da arte.
Na semana em que começa a Festa do Peão de Barretos, considerado o maior rodeio da América Latina, e em homenagem aos 95 anos de música sertaneja no Brasil, o g1 publica uma série de quatro reportagens para contar a história da 1ª gravação de uma música caipira em disco no país e como ela formou o gênero que moldou gerações em todas as décadas a seguir.
Nesta terça-feira (13), você confere quem foi Cornélio Pires, o homem que bateu na porta da gravadora Columbia e convenceu o proprietário a gravar “Jorginho do Sertão”, uma canção composta por ele com fragmentos de causos do folclore e que, na voz da dupla Mariano e Caçula, inaugurou o estilo musical que mais fatura até hoje no Brasil. (Assista ao vídeo abaixo e clique aqui para ver detalhes dessa história na primeira reportagem)
Como Cornélio Pires gravou a primeira música sertaneja no Brasiil e inaugurou um gênero
Na última reportagem da série, na quinta-feira (15), o conteúdo especial será um clipe de uma versão exclusiva para o g1 de “Jorginho do Sertão”, na voz de Edson e Hudson.
Cornélio Pires durante apresentação no início do século XX
Acervo/Pedro Massa/Instituto Cornélio Pires
As várias facetas
Cornélio Pires nasceu em Tietê no dia 13 de julho de 1884 e morou no município do interior de São Paulo até ter 17 anos. Lá, teve o primeiro contato com a escrita ao ser aprendiz na tipografia do jornal “O Tietê”. Quando chega a São Paulo, em 1901, ele começa a circular em um nicho intelectual do jornalismo e da literatura e aí passa a desenvolver a primeira de suas várias facetas: a de escritor.
Depois de fazer sucesso com textos em jornais da capital, ele começa a escrever livros, vira referência na literatura e resolve criar roteiros de peças teatrais. O mergulho no universo dos palcos faz Cornélio se envolver com uma característica que foi uma de suas grandes marcas: o humor. Ele se apresentava em vários lugares de São Paulo contando piadas, o que foi o embrião do formato de stand-up.
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E não parou por aí. Ele resolveu adaptar as peças de teatro bem-humoradas que escrevia, as levou para o cinema e guarda no currículo vários filmes assinados por ele.
Cornélio Pires
Acervo/Pedro Massa/Instituto Cornélio Pires
“Ele era um artista de alma inquieta, que se diria hoje um multimídia, e, por conta de ser início do século XX, ele acabou firmando várias bandeiras de pioneirismo em cada uma dessas áreas, então ele tem pioneirismo na literatura, ele foi o primeiro escritor brasileiro a registrar na literatura brasileira a poesia dialetal, foi o primeiro no cinema a fazer um filme independente falado, dentro do stand-up foi ele que criou essa história de contar piada em palco e ganhar dinheiro com isso”, disse o presidente do Instituto Cultural Cornélio Pires, Pedro Massa.
Pedro é músico e atualmente é responsável por toda a obra da figura mais ilustre de Tietê. Também natural do município, ele sempre teve contato com a história do escritor e resolveu, a partir de 2012, relançar o acervo de música e filmes de Cornélio Pires.
Além disso, ele mantém o instituto ativo e promove, por meio de exposições, a divulgação de todo o trabalho desta personalidade importante da cultura do Brasil.
Mas e a música?
Cornélio, apesar de se adaptar rápido à vida urbana da São Paulo do início do século XX, nunca deixou as raízes do interior para trás. Apaixonado pela efervescência da cultura caipira que se formava no interior, ele começa a ter contato com violeiros de Piracicaba (SP), entre eles Mariano e Caçula, para começar a musicar os “causos” que ouvia por onde passava.
Depois de fundar a “Turma Caipira do Cornélio Pires”, enxerga que aquela manifestação popular que surgia nas roças do Brasil tinha um potencial para ganhar o país e se tornar profissional. É aí que ele compõe “Jorginho do Sertão”, uma história mítica de um caboclo que vai carpir uma roça de café e, ao invés de receber o pagamento, recebe a proposta do patrão para se casar com uma das três filhas dele e acaba rejeitando os três casamentos.
Com a música em mãos, ele pagou do próprio bolso o disco para que a Columbia pudesse gravar a canção. A história foi contada na primeira reportagem da série, mas há, ainda, um bastidor curioso do interesse de Cornélio em registrar, em um disco, a primeira música caipira do Brasil: o incômodo pela “internacionalização” que o Brasil passava em 1929.
O Brasil nessa época vivia um sistema artístico de Belle Époque francesa, eram os gostos literários europeus, era a literatura rebuscada, a música rebuscada e o rádio começa a tomar uma determinada proporção na vida social brasileira, e ele percebe que as rádios não tocam material nacional, não toca música brasileira, ele sentiu uma invasão do tango argentino, muito tango tocando nas rádios, ele teve a ideia de pegar esse formato do show que ele fazia, as apresentações, com músicas, piadas, com causos, com imitações, e levar para o disco”
Pesquisador de cultura popular, Walter de Souza também valorizou o olhar diferenciado e à frente do tempo de Cornélio, que morreu em 17 de janeiro de 1958..
O Cornélio Pires tem uma biografia bem interessante. Ele nasce em Tietê, tem toda a convivência e a formação nessa cultura caipira, mas ele tem uma ascendência que não é efetivamente do homem de pé no chão. Ele vem para São Paulo para estudar no Largo São Francisco. Então ele vem para cá com uma pressão familiar para se tornar o doutor. E quando ele chuta tudo para o alto porque ele conclui a sua formação, mas ele fala, meu negócio é a cultura caipira e vou fazer o caminho contrário, vou trazer essa cultura para cá, para São Paulo. Ele tem essa preocupação de ser bem fiel a essa cultura para ser um registro genuíno.
Praça Cornélio Pires
Acervo/Pedro Massa/Instituto Cornélio Pires
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