Após 10 anos, famílias que sofreram prejuízos pela queda de avião que matou Eduardo Campos ainda buscam indenizações


Há uma década, o avião com o então candidato à Presidência Eduardo Campos caía no Boqueirão, em Santos. Até hoje, pessoas e comércios que tiveram prejuízos com a tragédia seguem lutando na Justiça por ressarcimento. Após 10 anos, famílias que sofreram prejuízos pela queda de avião que matou Eduardo Campos ainda buscam indenizações na Justiça
Vanessa Rodrigues/Jornal A Tribuna, Arquivo/A Tribuna Jornal e Vanessa Rodrigues/Jornal A Tribuna
Há exatos dez anos, em 13 de agosto de 2014, o avião Cessna Citation 560 XL, prefixo PR-AFA, caiu nos fundos de um imóvel na Rua Alexandre Herculano, perto da Rua Vahia de Abreu, no Boqueirão, em Santos. Dentre os mortos, o ex-governador de Pernambuco e então candidato à Presidência, Eduardo Campos (PSB). Uma década depois, famílias da Cidade que sofreram prejuízos pela queda da aeronave ainda buscam indenizações na Justiça.
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As sete pessoas – cinco passageiros e dois tripulantes – morreram. Além de Campos e dos pilotos Geraldo Magela Barbosa da Cunha e Marcos Martins, estavam no voo integrantes de sua equipe de comunicação: o jornalista Carlos Augusto Leal Filho (Percol), o assessor Pedro Almeida Valadares Neto, o fotógrafo Alexandre Severo e Silva e o cinegrafista Marcelo de Oliveira Lyra.
O avião deixou o Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, e tinha como destino a Base Aérea de Santos, em Guarujá. Porém, devido ao mau tempo, arremeteu durante tentativa de pouso e, pouco depois, caiu.
De acordo com o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão do Comando da Aeronáutica, a tripulação do jato sofreu desorientação espacial induzida tanto pelas condições climáticas desfavoráveis, com muitas nuvens, quanto por terem sido adotadas rotas não previstas para os procedimentos de pouso em Santos.
Além disso, o piloto e o copiloto não tinham treinamento específico para o modelo utilizado, e sim em versões anteriores. Foram descartadas hipóteses como fogo na aeronave, voo de dorso (de cabeça para baixo) e colisão aérea. O trabalho investigativo durou quase um ano e meio, sendo apresentado em janeiro de 2016.
Imagem mostra como está atualmente o local em que o avião que matou Eduardo Campos caiu, em Santos (SP)
Vanessa Rodrigues/Jornal A Tribuna
As ações
Um apartamento alugado na Rua Vahia de Abreu foi atingido por uma turbina. Nele, moravam Edna da Silva, os filhos Antony e Claudia e a neta Stephany, que atualmente residem em outro bairro de Santos.
“Com o acidente, a família perdeu tudo. Todos os seus pertences foram destruídos, e as consequências emocionais foram devastadoras, com transtornos psicológicos graves afetando a todos. Até hoje, eles não receberam qualquer compensação que pudesse minimizar o impacto dessa tragédia em suas vidas”, afirma o advogado da família, Joaquim Barboza.
O processo é movido contra quatro réus: o Partido Socialista Brasileiro (PSB), AF Andrade Empreendimentos e Participações Ltda. (atualmente em recuperação judicial), João Carlos Lyra e Apolo Santana Vieira.
“Até o momento, nenhum desses réus assumiu a responsabilidade pelo ocorrido, resultando em frustrante jogo de empurra, onde cada um tenta atribuir a culpa ao outro”, afirma Barboza.
A ação, que busca indenização por danos morais, materiais e estéticos, está na 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília. O processo se encontra na fase de recurso especial desde junho de 2021, sendo buscados o aumento das indenizações e o retorno do PSB ao polo passivo da ação.
Outras três ações também ainda não conseguiram êxito. Uma é ligada à Academia Mahatma e outra à pessoa física do proprietário do imóvel e do estabelecimento. As duas estão em segunda instância, o Tribunal de Justiça de São Paulo.
“Na de pessoa física, pedimos danos morais, materiais e lucros cessantes pela não utilização do imóvel no período da reforma. A juíza retirou o PSB como réu, alegando que não tinha vinculação com o avião. E recorremos para a segunda instância. No mesmo aspecto foi a demanda pela Mahatma, sobre a qual também recorremos, porque a mesma juíza fez igual, retirando o PSB”, diz o advogado Alexandre Ferreira.
A terceira, do Colégio Plenitude, teve sequência diferente. Em primeira e segunda instâncias, o PSB foi mantido como réu, mas o partido recorreu ao STJ para ser retirado.
Em nota, o PSB respondeu que “a maior parte dos processos já foi favorável ao partido. Aguardaremos a decisão da Justiça sobre os demais processos. Entendemos que a responsabilidade é da empresa proprietária da aeronave”. A reportagem também tentou contato com a AF Andrade, mas não encontrou os responsáveis nos contatos atribuídos à empresa.
No local do fato, a força da notícia
Bombeiros trabalhando no local onde caiu o avião que levava Eduardo Campos
Arquivo/A Tribuna Jornal
O jornalista Mário Jorge de Oliveira se preparava para voltar ao trabalho naquele 13 de agosto de 2014, após 30 dias de férias. Era o editor da Primeira Página de A Tribuna, função que ocupou por pouco mais de 18 anos – entre maio de 2003 e dezembro de 2021.
Para quem sempre estava de olho nas notícias, um importante fato ocorria bem perto do quinto do andar do edifício em que mora até hoje, na Rua Alexandre Herculano: a queda do avião que matou Eduardo Campos.
“Corri para a área de serviço, postando-me na janela, olhando para o alto. Na hora, a explosão. Fui deslocado para trás no instante em que avistei a bola de fogo levantando do quintal de um imóvel vizinho, a poucos metros de onde eu estava. No apartamento, só eu e a mascote da família, a cachorrinha Nina, igualmente assustada e latindo”.
Dentro de casa, tudo certo. Quando Mário abriu a porta, deu de cara com as pessoas descendo pelas escadas. Queriam ver o que estava acontecendo ou por medo mesmo de um abalo à estrutura da construção. “Ajudei uma senhora com idade avançada a ir pelas escadas, já que o elevador parou de funcionar”.
A senha
Autoridades trabalhando no local onde caiu o avião que levava Eduardo Campos
Arquivo/A Tribuna Jornal
A ligação de Arminda Augusto, então editora-chefe de A Tribuna e atual gerente de Projetos e Relações Institucionais do Grupo Tribuna, foi a senha para se descobrir o que acontecia, recorda o jornalista.
Ela estava em Guarujá para um evento que reunia candidatos à Presidência da República. “Mário, a gente está aqui esperando o Eduardo Campos e já falaram que um avião caiu aí no Boqueirão. Está sabendo de algo?”, disse ela.
Mário Jorge havia saído 15 minutos antes da Academia Mahatma, um dos imóveis bastante atingidos. As duas filhas estavam na escola e a mulher, no trabalho. “De lá, minha esposa Simone me ligou e contou o que aconteceu, mas ela não teve a dimensão do fato. Só depois, chegando em casa, por volta de meio-dia, constatou a grandiosidade da coisa”.
A condição de morador permitiu a Mário acompanhar e documentar de perto todo aquele drama para A Tribuna. “Enquanto morador, mas sendo jornalista, usei esse ‘privilégio’ para entrar nas áreas restritas. Com uma máquina fotográfica rudimentar, registrei alguns dos momentos mais dramáticos do episódio: o recolhimento de partes de corpos, uma massa disforme, que pouco indicavam a quem pertencia, terra e metal retorcido. Nos três dias que se seguiram, produzi fotos e vídeos até ser alertado que militares da Aeronáutica tentavam descobrir quem havia burlado o cerco e feito aquelas imagens. Não havia como parar, e por dois motivos: eu estava emocionalmente envolvido com aquela tragédia e sou jornalista”.
Ainda hoje, os ecos daquele acontecimento povoam a mente de Mário. “Entre escapar dos argumentos sacros, de que um milagre evitou o mal maior, e das opiniões um pouco mais técnicas, para as quais o piloto teria avistado uma área de reduzidíssimos metros quadrados e direcionado a aeronave a este local, fico na incógnita, à espera (talvez, vã) de uma resposta racional e plausível”.
Resiliência para poder reconstruir
Após 10 anos, famílias que sofreram prejuízos pela queda de avião que matou Eduardo Campos ainda buscam indenizações na Justiça
Vanessa Rodrigues/Jornal A Tribuna
Depois de uma década, a Academia Mahatma segue em reconstrução. O local foi um dos mais atingidos, em especial do meio para o fundo, pois fica ao lado do imóvel que abriga o quintal no qual a aeronave caiu.
“A luta permanece até hoje. A gente veio reformando por etapas, com o que dava o dinheiro naquele momento”, afirma o proprietário e professor de Educação Física, Benedito Juarez Câmara, prestes a completar 79 anos.
A sala de musculação e a piscina foram os espaços mais atingidos. “Só depois de quatro anos a gente repôs um piso vinílico na musculação. Até então, a gente ficou no cimento puro, porque não tinha o que fazer”.
Encanamentos e azulejos da piscina, que fica na parte de baixo, também foram sendo consertados no mesmo ritmo. “Agora que estou recuperando os amortecedores do equipamento hidráulico, que a gente perdeu tudo”.
Ainda que parcialmente, a academia reabriu quase um ano depois da tragédia, em julho de 2015. Enquanto isso, funcionou em uma sala adaptada no Colégio Stella Maris. Tudo sem dispensar os funcionários.
“Iria tirar a filha do colégio, pois não tinha como pagar a mensalidade, assim como tinha que cortar outras coisas em casa. A diretora exigiu que ela ficasse e o colégio acabou me cedendo esse espaço muito bom”.
Antes do acidente, a Mahatma tinha pouco mais de 700 alunos. Atualmente, ultrapassa os 400. O nome da academia é um honorífico na Índia. Não à toa, significa grande alma. “Tem que ter muita resiliência e, principalmente, fé. Crise e problemas vamos ter todos os dias. O importante é você ter solução”.
Falta d’água evitou o pior em escola
Após 10 anos, famílias que sofreram prejuízos pela queda de avião que matou Eduardo Campos ainda buscam indenizações na Justiça
Vanessa Rodrigues/Jornal A Tribuna
Parece incrível, mas faltar água nas imediações da queda acabou sendo benéfico para o Colégio Plenitude, de Educação Infantil. “Permaneci com a escola aberta para atender os pais e trabalhávamos normalmente. Mas reduzimos os banhos, o que foi uma sorte porque estouraram os vidros nos banheiros onde eles estariam, entre 9 e 10 horas”, relembra a mantenedora e diretora da escola, Christina Raite.
Havia 30 crianças (de um total de 75 matriculados) nas dependências do colégio, que possui três andares: o térreo e mais dois. Elas estavam nos berçários e outra turma, maior, brincava no parque, no fundo do último andar. O fator sorte entrou em ação novamente. “Os vidros das duas janelas ficaram estraçalhados, mas eles não ficam do mesmo lado em que as crianças estavam”.
No dia do acidente, as funcionárias saíram de imediato do imóvel com as crianças e se abrigaram em um prédio residencial mais próximo da Avenida Conselheiro Nébias, por indicação de segurança por parte do Corpo de Bombeiros. A ordem era evacuar a área por risco de explosão.
O Plenitude ficou fechado por pouco mais de uma semana e a equipe teve que trabalhar de maneira precária por um mês, com lonas nas janelas, por exemplo.
“Fiquei muito preocupada de como seria o retorno, mas os pais foram muito solícitos, e a volta foi melhor do que eu esperava. Trouxeram cestas de café da manhã e flores para as professoras. Conseguimos voltar com nossa vida normal, mas é uma tragédia que dura para sempre”.
Acidente de avião que matou Eduardo Campos e mais seis em Santos (SP) completa dez anos
Globo News e Arquivo/A Tribuna Jornal
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