Fazenda tenta limitar perdas fiscais da “tese do século” em julgamento no STJ, mas decisão é adiada

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) adiou nesta quarta-feira (14) julgamento acompanhado de perto pelo Ministério da Fazenda que busca uma limitação de perdas com a chamada “tese do século”, decisão que gerou forte impacto fiscal ao reduzir a base de cálculo de tributos federais.

A sessão foi interrompida a pedido do ministro Gurgel de Faria, após um voto contrário ao governo pelo relator do caso, ministro Mauro Campbell Marques, e um voto favorável do ministro Herman Benjamin.

Faltam oito votos para a decisão da primeira seção do STJ. O ministro Faria terá até 60 dias para devolver o caso para análise do colegiado.

A Fazenda pede que sejam revisadas decisões judiciais tomadas a favor de contribuintes durante o período em que o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia decidido contra o governo nesse caso, mas ainda não tinha feito um recorte temporal do efeito da decisão.

Uma autoridade da Fazenda com conhecimento do assunto explicou que a pasta tentou suspender o trâmite desses processos de inúmeras maneiras, no próprio STF e nos Tribunais Regionais Federais, mas não teve sucesso, com o tema agora chegando ao STJ.

“Para que seja aplicado de maneira uniforme e isonômico o precedente do STF, o único meio processual disponível é a ação rescisória. O STJ tem alguma resistência a essas ações, mas este caso é bem particular, estamos confiantes num resultado favorável”, disse a fonte sob condição de anonimato.

Na chamada “tese do século”, o STF decidiu em 2017 que o ICMS não deveria compor a base de cálculo dos tributos federais Pis e Cofins, uma derrota estimada em mais de R$ 240 bilhões pelo governo na ocasião.

No entanto, apenas em 2021 a Corte definiu que esse entendimento deveria ser válido, de maneira geral, apenas a partir da decisão tomada em 2017.

Com a lacuna de tempo entre as decisões, tribunais julgaram uma série de casos em favor de contribuintes que, na visão da Fazenda, agora deveriam ser revertidos por descumprirem a modulação. Segundo a fonte, 78% das ações judiciais sobre essa matéria foram ajuizadas por empresas após 2017.

No julgamento desta quarta, o relator do caso não acatou os argumentos apresentados pelo governo, afirmando que o pedido de revisão não deveria ser aceito.

“Se não havia modulação, sequer havia norma jurídica a ser violada. Não há como violar aquilo que sequer existe”, disse.

Na avaliação de Henrique Morum, tributarista no Chinaglia Nicacio Advogados, se os ministros restantes da seção acompanharem o relator no sentido de não acatar a ação rescisória, haverá um “importante direcionamento do STJ por privilegiar a segurança jurídica e a coisa julgada”.

Para o sócio tributarista de TozziniFreire Advogados, Bruno Teixeira, a ação no STJ representa um risco significativo para contribuintes que entraram com ações após a decisão de 2017 do STF, mas antes da modulação.

“Caso a Fazenda seja exitosa na ação rescisória, o contribuinte terá que devolver todo esse valor para a Fazenda Nacional com multa de mora e juros. Ou seja, o contribuinte ganha o processo judicial, obtém o trânsito em julgado, confia no Judiciário e aí vem uma ação rescisória que rescinde aquilo”, disse.

As companhias impactadas pelas decisões têm o direito de reaver os tributos pagos por meio de compensações tributárias, que apresentaram forte crescimento nos últimos anos e entraram na mira da Fazenda sob a alegação de que o movimento coloca em risco o esforço fiscal do governo.

A Fazenda conseguiu aprovar neste ano uma regra para limitar o uso de compensações tributárias provenientes de decisões judiciais, iniciativa adotada mirando também os casos da “tese do século”.

Na justificativa da medida, a pasta argumentou que os débitos compensados por empresas nos últimos cinco anos somaram R$ 1 trilhão, com uma alta superior a 14% em 12 meses até agosto de 2023 em comparação com o mesmo período de 2022.

Na ocasião, a Fazenda disse ainda que as compensações provenientes de decisões judiciais passaram a representar 38% de todos os desembolsos desse tipo a partir de 2019 – entre 2005 e 2018, a fatia era de 5%.

Mesmo com a limitação, o governo editou em junho uma nova MP para criar outras travas nas compensações de Pis/Cofins, argumentando que as ações adotadas até então não eram “suficientes para recompor a receita da União”. A iniciativa gerou forte reação e acabou devolvida pelo Congresso.

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