CadÚnico adota uso de nome social, identidade de gênero e orientação sexual após ação do MPF-AC


De acordo com apuração do órgão, Ministério da Cidadania não apresentou justificativa plausível para se negar a incluir os dados, em prejuízo da população LGBTQIA+. Procedimento se converteu em ação e obteve atualização do sistema. MPF-AC apura falta de campos relacionados à identidade de gênero e orientação sexual em formulário do CadÚnico
Arquivo/MPF-AC
O Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) passou a adotar o uso dos campos ‘nome social’, ‘orientação sexual’ e ‘identidade de gênero’ após uma ação do Ministério Público Federal do Acre (MPF-AC).
📲 Participe do canal do g1 AC no WhatsApp
Em 2023, o órgão instaurou um inquérito civil para apurar a falta dos campos no sistema administrado pelo então Ministério da Cidadania, que passou a ser Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS).
Essa apuração, segundo o MPF, se converteu em uma ação em janeiro deste ano, que obteve a atualização da plataforma.
LEIA TAMBEM:
MPF-AC questiona decisão do IBGE de inserir dados sobre população LGBTQIA+ em pesquisa de saúde e não no Censo 2022
Acre é o 4º estado com menor percentual de adultos que se autodeclararam homossexuais ou bissexuais, aponta IBGE
“Na ação assinada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão no Acre, Lucas Costa Almeida Dias, o MPF pediu que a União unificasse o campo “nome” – sem distinção entre o nome social e o nome de registro civil –, e excluísse o campo “sexo” nos cadastros da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Os dados cadastrais são alimentados pelo Serviço de Identificação do Cidadão, sistema administrado pelo Governo Federal, a partir de decreto editado em novembro de 2023”, informou o MPF-AC.
Em outubro deste ano, o MDS publicou um informe no qual comunicou as atualizações no formulário do CadÚnico, com alterações que não incluem apenas a inserção de dados de pessoas LGBT+, mas também muda outros detalhes burocráticos. “Essas modificações têm como objetivo melhorar a coleta de dados e garantir maior precisão nas informações fornecidas pelas famílias. Além disso, buscam aprimorar a coleta de dados importantes para a caracterização das pessoas e das famílias, como a identificação de filiação e o registro do nome social”, diz o informe.
Segundo o informe, o formulário já continha espaço para ‘nome social’, junto ao campo ‘apelido’. Com a alteração, o campo passa a ser classificado apenas como ‘nome social’. O novo formulário também incluiu um item que pergunta ao beneficiado se deseja informar o gênero, outro para informar se a pessoa é trans, travesti ou não e um campo para o usuário informar se a identidade de gênero é masculina, feminina ou não-binária.
Mudanças foram informadas por meio de informe do MDS
Reprodução
“A alteração do campo 4.04 e a inserção dos campos 4.16, 4.17 e 4.18 fazem cumprir o Decreto N. 8.727 de 28 de julho de 2016, sobre uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional”, alegou o ministério.
As mudanças informadas entraram em vigor no dia 26 de outubro, ainda conforme o ministério.
‘Agora, com as alterações promovidas pelo Governo Federal no CadÚnico, os seguintes campos foram modificados: 1) o campo ‘apelido’ passa a ser o de nome social; 2) foi acrescentada a marcação para a pessoa identificar se é trans ou travesti; 3) foi acrescentado o campo ‘gênero’, em que a pessoa pode se identificar como não binária; 4) os campos ‘mãe’ e ‘pai’ foram alterados por ‘filiação 1’ e ‘filiação 2′”, acrescentou o MPF.
Inquérito
Atendimento CadÚnico
Emerson Rocha
O inquérito foi instaurado por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) no Acre. De acordo com o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias, o direito fundamental à igualdade e o próprio valor da dignidade humana, ambos previstos na Constituição Federal, impõem o respeito às diversas formas de existência.
Ainda de acordo com ele, a falta dos campos no Cadastro Único agrava a invisibilidade dessas pessoas, dificultando o acesso a fatores decisivos para romper o ciclo de exclusão, como emprego e renda.
“Esse ciclo é muitas vezes iniciado no núcleo familiar e culmina em evasão escolar, situação de rua, insegurança alimentar, desemprego, informalidade/marginalização no mercado de trabalho e vulnerabilidade social”, afirma o procurador.
Ele cita também a obrigatoriedade imposta pelo Decreto 8.727/2016, que determina o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de mulheres transexuais e travestis, e homens trans no âmbito da Administração pública federal.
CadÚnico
O Cadastro Único (CadÚnico) é o principal instrumento do Estado brasileiro para a seleção e a inclusão de famílias de baixa renda em programas federais, utilizado obrigatoriamente para a concessão dos benefícios do Programa Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família), Tarifa Social de Energia Elétrica, Auxílio Gás, Programa Minha Casa Minha Vida/Minha Casa Verde Amarela, além de servir para a seleção de beneficiários de diversas políticas públicas dos governos estaduais e municipais.
No ano passado, o Ministério da Cidadania informou que, naquele momento, seria impossível executar alterações no cadastro por se tratar de informações que dizem respeito à intimidade das pessoas e têm forte caráter individual. Além disso, as mudanças nos formulários demandariam modificações tecnológicas, debates internos entre o Ministério e os gestores estaduais distritais e municipais do Cadastro Único, além de outros órgãos públicos, instituições de pesquisa oficiais e setores da sociedade civil interessada.
Segundo o MPF, depois de quase um ano desta resposta, não há, até o momento, informação de que os debates e modificações citados pelo Ministério da Cidadania foram sequer iniciados. Além disso, com relação à sensibilidade dos dados, alegada pelo órgão, o tratamento de dados sensíveis não é novidade nos formulários do Cadastro Único, já que o quesito sobre cor e raça, por exemplo, também faz parte desse grupo, suscita dúvidas na população e é objeto de treinamento no Manual do Entrevistador.
VÍDEOS: g1
Adicionar aos favoritos o Link permanente.