
O Supremo Tribunal Federal analisa dois recursos que questionam o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que diz que as redes sociais só podem ser responsabilizadas se não cumprirem uma ordem judicial para remover conteúdo falso ou criminoso. Com seis votos a um, o STF – Supremo Tribunal Federal formou maioria para que as redes sociais sejam responsabilizadas pela publicação de conteúdos ilegais ou criminosos.
O primeiro a votar nesta quarta-feira (11) foi o ministro Flávio Dino. Ele foi a favor de responsabilizar as redes sociais se não removerem conteúdos ilegais e criminosos depois de serem notificadas pelas vítimas.
O STF – Supremo Tribunal Federal analisa dois recursos que questionam o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que diz que as redes sociais só podem ser responsabilizadas se não cumprirem uma ordem judicial para remover conteúdo falso ou criminoso.
Os relatores Dias Toffoli e Luiz Fux consideraram todo o artigo 19 inconstitucional. Para os dois ministros, as empresas podem ser punidas se não removerem postagens ofensivas e criminosas de seus usuários depois de notificadas pelas vítimas. Não seria necessária ordem judicial para que as plataformas tenham responsabilidade pelas postagens, mas elas só seriam punidas se a Justiça viesse a entender que a postagem era criminosa e a empresa nada fez.
Na prática, elas teriam que fazer uma análise preliminar das publicações que fossem denunciadas para impedir que posts criminosos continuassem disponíveis. Isso valeria para publicações com conteúdo racista, discurso de ódio, pornografia infantil e ataques à democracia.
O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, concordou e também votou a favor de que as empresas ajam imediatamente em casos de crimes contra direitos básicos, mas defendeu a necessidade de ordem judicial para remoção de conteúdos que configurem crimes contra a honra, como de injúria, calúnia e difamação.
Na semana passada, o ministro André Mendonça abriu divergência e votou pela validade do artigo 19 do Marco Civil. Ele avaliou que, a não ser nos casos expressamente autorizados em lei, as plataformas não podem ser responsabilizadas por não remover conteúdo ofensivo do usuário.
Nesta quarta-feira (11), o ministro Flávio Dino votou pela responsabilização das plataformas e disse que o STF não está julgando liberdade de expressão, mas a responsabilidade pelo que se publica:
“A responsabilidade não impede a liberdade. Só existe liberdade com responsabilidade. Liberdade sem responsabilidade é tirania. E esse é um conceito assentado, não só na nossa Constituição, como na tradição filosófica que nós preservamos”.
Maioria do Supremo vota a favor de responsabilizar as redes sociais por conteúdo ilegal ou criminoso publicado
Jornal Nacional/ Reprodução
Dino citou massacres em escolas na época em que era ministro da Justiça e também lembrou do ataque de Suzano, em 2019, que deixou dez mortos. Ele argumentou que esse tipo de ataque é por vezes organizado ou antecipado nas redes sociais, sem controle das plataformas. O ministro também lembrou de conteúdos falsos que influenciam os resultados das eleições.
Em um aparte, o ministro Alexandre de Moraes criticou o mecanismo de monetização das plataformas:
“As redes que não querem de forma alguma serem reguladas e não se autorregulam, os algoritmos não são randômicos, eles são direcionados. E não só direcionados, como eles, a partir da inteligência artificial, pegam as ideologias e as questões econômicas que mais favorecem as redes. Então, essas questões, no Brasil e no mundo, de se levar agressões, ataques às escolas, isso dá likes. Os likes são monetizados e isso gera dinheiro”.
O ministro Cristiano Zanin acompanhou a tese de que as plataformas podem ser responsabilizadas caso não retirem conteúdo criminoso após serem informadas. Ele considerou que, desde a entrada em vigor do Marco Civil da Internet, em 2014, houve um aumento da disseminação de conteúdo ilícito e lembrou que os algoritmos – mecanismos que analisam o comportamento dos usuários nas redes – priorizam as publicações que trazem mais engajamento:
“Na minha compreensão, a prognose legislativa de promoção legítima da liberdade de expressão não se confirmou empiricamente, tendo, na verdade, potencializado a disseminação de conteúdo ilícito na internet, com graves consequências para o sistema de direitos fundamentais individuais e coletivos e ainda para o Estado Democrático de Direito. Muitas intermediárias de conteúdo, incluindo as chamadas plataformas de redes sociais, não correspondem ao ideal de neutralidade do Marco Civil da Internet e possuem papel ativo na disseminação de conteúdo publicado e exercem influência sobre os fluxos de informação por meio de curadoria algorítmica e políticas de engajamento, impulsionamento e publicidade patrocinada”.
Depois foi a vez do ministro Gilmar Mendes. Ele votou pela responsabilização das redes sociais caso não removam conteúdo criminoso. O ministro afirmou que regular as plataformas digitais é proteger direitos, inclusive a própria liberdade de expressão:
“As plataformas digitais já funcionam como verdadeiros curadores do discurso público – isso é bem claro -, determinando, através de algoritmos opacos, quais mensagens alcançam amplas audiências e quais permanecem invisíveis. Da forma como redigido hoje, o Marco Civil da Internet representou um véu da irresponsabilidade para plataformas digitais. Mesmo que sejam informadas da ocorrência de crimes em suas plataformas, elas não podem ser responsabilizadas por danos gerados por manter esse conteúdo no ar, a não ser em caso de ordem judicial. Cumpre destacar que estamos falando, muitas vezes, de hipóteses patentes de crimes”.
Com o voto do ministro Gilmar Mendes, o tribunal formou maioria para definir que as plataformas digitais podem ser responsabilizadas se não removerem publicações criminosas de usuários — mesmo sem uma decisão judicial. Mas o julgamento ainda não terminou. Faltam os votos de quatro ministros.
Ao final, o plenário ainda vai definir quais são as obrigações das plataformas ao fiscalizar conteúdos que circulam nas redes sociais e em que circunstâncias elas podem ser punidas.
O julgamento vai ser retomado nesta quinta-feira (12) com os votos dos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes.
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