Deputados da França derrubam primeiro-ministro em união inédita entre esquerda e extrema direita


Parlamento aprovou moção de censura nesta quarta (4) contra Michel Barnier, premier que foi indicado por Macron ao cargo. Com moção, Barnier teve de deixar o poder, no governo mais curto da Quinta República da França. Michel Barnier e Emmanuel Macron, primeiro-ministro e presidente da França, respectivamente.
Michel Euler / POOL / AFP
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Em uma união inédita entre a esquerda e a extrema direita, os deputados da França derrubaram nesta quarta-feira (4) o primeiro-ministro do país, Michel Barnier, que teve o governo mais curto da história recente da França.
Por maioria e como esperado, os deputados aprovaram uma moção de censura contra Barnier — mecanismo parlamentar através do qual legisladores podem retirar um chefe de governo do poder caso não estejam satisfeitos com sua gestão.
Michel Barnier, político pragmático e veterano, foi colocado no posto há apenas três meses pelo presidente Emmanuel Macron — na França, o primeiro-ministro governa junto ao presidente, que pode tanto convocar eleições para eleger um premiê quanto indicar um nome fora do pleito.
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Os franceses foram às urnas em junho para as eleições parlamentares. O bloco da esquerda venceu, barrando a favorita Reunião Nacional, da extrema direita, mas não alcançando a maioria necessária para formar governo.
Macron decidiu, então, escolher um primeiro-ministro de centro-direita, em decisão que gerou uma onda de protestos e conversas inéditas entre a esquerda e a extrema direita para derrubar a escolha do presidente.
Nesta quarta, eles votaram em conjunto para aprovar a moção de censura. Ao todo, 331 dos 574 deputados se posicionaram a favor da medida. A votação precisava do apoio de pelo menos 288 deputados para ser aprovada.
Sozinhos, os grupos de oposição — extrema direita e o bloco de esquerda — somam quase 330 cadeiras.
Com a moção aprovada, Michel Barnier deixa automaticamente o poder. Agora, cabe agora a Macron decidir se negocia com os partidos majoritários no Parlamento ou indica outro nome — o que pode gerar uma nova onda de protestos e desgastar ainda mais seu governo.
Fontes do governo francês ouvidas pela agência de notícias Reuters afirmaram que o presidente francês deve arriscar o desgaste e indicar outro nome para ocupar o posto, e que novo premiê pode ser anunciado já no fim de semana.
Crise política
A insatisfação com a indicação de Macron de um nome que nem sequer participou das eleições foi crescendo entre os deputados ao longo e culminou na rejeição, esta semana, da proposta de Orçamento apresentada por Barnier.
Também contou para a crise um momento tenso na economia da França — a segunda maior da União Europeia. O prêmio de risco da dívida francesa está quase igual ao da Grécia, um dos piores do continente.
Além disso, a instabilidade na França e a crise de governo na Alemanha, que precisou antecipar as eleições legislativas para 23 de fevereiro, podem afetar a União Europeia a poucas semanas do retorno de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos.
Em maio, o presidente Emmanuel Macron surpreendeu o país e também antecipou as legislações, que estavam previstas para 2027, após a vitória da extrema direita nas eleições para o Parlamento Europeu na França.
A antecipação do pleito foi uma jogada política de Macron diante do resultado ruim de seu partido e do avanço da extrema direita nas eleições para o Parlamento europeu — o Legislativo de todos os países da União Europeia, com sede em Bruxelas.
As pesquisas de opinião apontavam o Reunião Nacional, sigla de extrema direita de Marine Le Pen, como favorito. Mas a esquerda, que se uniu em um bloco amplo, surpreendeu e terminou em primeiro na votação. Mesmo assim, o bloco não conseguiu formar maioria. Tentou aliança com a centro-direita, de Macron, que rejeitou o nome proposto pela esquerda para governar e desfez a parceria.
Governo mais curto da 5ª República
Macron nomeia novo primeiro-ministro na França
A aprovação da moção de censura tornou o governo de Barnier o mais curto da Quinta República francesa, que começou em 1958.
Esta foi também a primeira vez em mais de 60 anos que o Legislativo francês derrubou um chefe de governo por meio de uma moção de censura. A última vez em que isso aconteceu foi em 1962 com a administração de Georges Pompidou e quando Charles de Gaulle era presidente.
Embora o presidente de centro-direita já tivesse perdido a maioria absoluta após sua reeleição em 2022, as novas eleições resultaram em uma Assembleia sem maioria clara e dividida em três blocos irreconciliáveis: esquerda, centro-direita e extrema direita.
A Nova Frente Popular (NFP) — coalizão de socialistas, comunistas, ambientalistas e integrantes da esquerda radical — venceu as eleições, mas, quase dois meses depois, Macron nomeou Barnier, ex-negociador europeu para o Brexit, como primeiro-ministro, em nome da “estabilidade”.
Barnier só conseguiu o apoio da aliança de centro-direita de Macron e de seu próprio partido conservador, Os Republicanos (LR), o que significa que a sobrevivência de seu governo dependia da líder de extrema direita Marine Le Pen, que finalmente decidiu pela queda.
Orçamento
A rejeição da proposta de Orçamento foi o principal fator que impulsionou a votação da moção de censura.
Com um orçamento baseado na redução do gasto público e no aumento temporário dos impostos para grandes empresas, o governo pretendia reduzir o déficit público (projetado para 6,1% do PIB em 2024) e a dívida pública (112% do PIB no final de junho).
“Ao incluir seu orçamento na desastrosa continuidade de Emmanuel Macron, o primeiro-ministro só poderia fracassar”, escreveu a líder do partido de extrema direita Reagrupamento Nacional (RN) na rede social X.
Em uma entrevista aos canais TF1 e France 2, Barnier se defendeu e afirmou que mudanças foram feitas no plano inicial, depois que o governo “ouviu todos”. Ele acusou Le Pen de entrar em “uma espécie de disputa”, com reivindicações sem fim.
Além do orçamento, os partidos jogam suas cartas para 2027, quando os franceses terão de votar para escolher o sucessor de Macron, que chegou ao poder em 2017 e não pode ser reeleito após completar seu segundo mandato.
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