O que é a educação escola indígena e quais os desafios no Brasil?

No início de fevereiro, o governador do Pará, Helder Barbalho, revogou a Lei 10.820/2024, que trata da carreira dos professores e da rede estadual de ensino, o que gerou protestos por parte de lideranças indígenas do estado. A matéria, que estipulava o ensino remoto na educação indígena, acabava também com o Somei (Sistema Modular de Ensino Indígena), dispositivo utilizado para adaptar os ritos do magistério para a realidade e a cultura dos povos originários.

“Quero pedir a colaboração de vocês nesse debate, nessas discussões, para que a gente possa ter uma lei robusta e a melhor lei que garanta direitos e, acima de tudo, que garanta as especificidades que a educação indígena tem”, explicou Barbalho, em nota, após a revogação da lei motivada por pressões.

A revolta, apoiada por professores e sindicalistas do Pará, lançou luz sobre a importância de adaptar o ensino para os diferentes povos que habitam o Brasil. Para entender melhor esse cenário, conheça a seguir a história da educação escolar indígena, o que ela representa e os desafios que enfrenta no Brasil.

O que é, afinal, a educação escolar indígena?

Em linhas gerais, a educação escolar indígena é uma modalidade de ensino que busca atender às especificidades culturais, linguísticas e sociais dos povos indígenas no Brasil. Ela vai além da simples transmissão do conhecimento formal, pois tem como objetivo preservar e fortalecer as identidades, línguas e tradições desses povos.

Como a educação escolar indígena evoluiu no Brasil?

No Brasil que conhecemos, a educação de pessoas indígenas começa a partir da imposição cultural da Coroa Portuguesa, concretizada na ação dos jesuítas com o objetivo de converter e “civilizar” os povos indígenas a partir da catequese.

Segundo a pesquisadora Juliana Medeiros, em seu artigo “História da Educação Escolar Indígena no Brasil”, essa prática impunha o uso do português e a adoção de costumes europeus, muitas vezes em detrimento das línguas e tradições originárias.

Ainda assim, mesmo durante o Império e a República, instituições ativistas implementaram políticas que visavam integrar os indígenas à sociedade brasileira por meio da escolarização, mas sempre com um viés eurocêntrico do ensino.

Só séculos depois, quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, é que o Brasil garante aos povos indígenas o direito de manter e fortalecer suas instituições, línguas, costumes e tradições, reconhecendo sua organização social diferenciada.

Em 2008, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional determinou a inclusão de conteúdos sobre história e cultura indígena nos currículos escolares, reforçando a necessidade de um ensino que contemple os saberes e práticas desses povos.

No ano seguinte, em 2009, a Educação Escolar Indígena é organizada em Territórios Etnoeducacionais (TEE), o que, na teoria, ajudaria a criar as bases da educação prometida na Constituição. A medida ajudou o governo a designar melhor recursos para bolsas e novas escolas e creches adaptadas para a educação indígena.

Um dos exemplos de avanço a partir da criação das políticas públicas foi a implementação do ensino bilíngue, que garante o aprendizado a partir da língua nativa dos povos indígenas ao mesmo tempo em que aprendem a língua portuguesa.

Desafios para o futuro

Apesar dos avanços nas últimas décadas, a educação escolar indígena ainda enfrenta desafios significativos que precisam ser superados para uma efetivação mais ampla e de qualidade. Atualmente, por exemplo, pelo menos 15% da população indígena no Brasil é analfabeta, conforme o Censo Demográfico de 2022, divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Além disso, apenas 2% das escolas do país oferecem educação indígena, segundo pesquisa da Campanha Brasileira pelo Direito à Educação, publicada no fim do ano passado.

A falta de infraestrutura e recursos pedagógicos de qualidade também são entraves para o avanço.

Segundo o último Censo Escolar, de 2023, apenas 24,8% dessas instituições dispõem de material pedagógico, enquanto somente 12,8% possuem bibliotecas ou salas de leitura. E somente 5,5% das escolas contando com banheiros adequados para a faixa-etária das crianças.

Do ponto de vista da tecnologia, o acesso à internet é uma realidade para 43%, enquanto quase um terço delas ainda carece de fornecimento de energia elétrica.

Já em termos territoriais, em um universo de mais de 178 mil instituições de ensino básico, apenas 3.541 estão localizadas em terra indígena, ministrando conteúdos diferenciados que respeitam os aspectos etnoculturais, e 3.597 oferecem a modalidade por meio das redes de ensino.

Há, no entanto, promessas do MEC (Ministério da Educação) para ampliar os recursos destinados a essa parcela da população brasileira.

Segundo a Comissão Intergovernamental de Financiamento para a Educação Básica de Qualidade, o valor mínimo por matrícula na educação escolar indígena será elevado a partir deste ano. Segundo o órgão, valor sairá de R$ 6,3 mil para R$ 7,5 mil, com uma acréscimo pouco mais de R$ 1 mil por ano.

Além disso, há ainda uma Portaria do MEC que criou um grupo de trabalho para definir estratégias e ações em prol da construção da primeira Universidade Indígena do Brasil, além de um PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que prevê investimentos para a construção de 65 escolas e 100 creches destinadas aos povos indígenas e às comunidades quilombolas.

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Este conteúdo foi originalmente publicado em O que é a educação escola indígena e quais os desafios no Brasil? no site CNN Brasil.

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