Despesa livre no orçamento cai a zero em 2029; economistas veem “colapso”

As despesas discricionárias do governo federal devem cair para praticamente zero no fim desta década, estrangulando a máquina pública e eliminando a capacidade de executar investimentos mínimos, conforme projeções divulgadas na terça-feira (15) durante a apresentação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO).

Os números compilados pela equipe econômica mostram que os gastos discricionários do Poder Executivo vão ser de apenas R$ 8,9 bilhões em 2029 — o que representa ínfimos 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano.

Em 2025, as despesas livres para execução do governo federal estão em 1,8% do PIB. Elas vão encolhendo para 1,5% em 2026, depois para 0,8% em 2027 e para 0,4% em 2028.

“É a crônica de uma morte anunciada”, disse à CNN o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Marcus Pestana.

“Temos um dos orçamentos mais engessados do mundo. A situação lembra o pianista do Titanic, que seguia tocando como se nada estivesse acontecendo, enquanto o navio afundava”, acrescentou

Despesas discricionárias são aqueles gastos não obrigatórias, como recursos para custeio e investimentos. As obrigatórias são, sobretudo, pagamento de pessoal e benefícios previdenciários.

Na prática, sem a maior parte das discricionárias, o governo não funciona — é o chamado “shutdown”, no jargão dos economistas.

De acordo com Pestana, a máquina pública tende a parar antes mesmo de as despesas livres chegarem a zero.

Nos cálculos da IFI, é preciso ter um espaço de 0,7% do PIB para pagar gastos considerados básicos, como energia elétrica e serviços de informática nos ministérios.

“Abaixo disso, passa a faltar munição para o Exército e gasolina para abastecer os carros da Polícia Federal”, exemplifica Pestana. “É um cenário de shutdown.”

Em recente estudo, a consultoria de orçamento da Câmara dos Deputados mencionou a valorização real do salário mínimo e os “pisos” (mínimos constitucionais) da
saúde e da educação – 15% da receita corrente líquida (RCL) e 18% da receita líquida de impostos (RLI) — como fatores que tiram espaço das despesas livres ao longo do tempo.

Além disso, o alto valor das emendas parlamentares — R$ 50,4 bilhões no total e R$ 39 bilhões impositivas somente em 2025 — é citado.

Para o economista Jeferson Bittencourt, ex-secretário do Tesouro Nacional e head de macroeconomia da ASA, é uma situação “insustentável”.

O economista lembra que o mínimo da série histórica para as despesas discricionárias foi registrado em 2021, quando se chegou a apenas 1,38% do PIB.

“O cenário a partir de 2027 já é compatível com um shutdown da máquina pública”, avaliou.

Daqui a dois anos, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), os gastos com o pagamento de precatórios não poderá mais ser deduzido do resultado primário.

O gasto com precatórios em 2026 é estimado em R$ 116 bilhões. Em 2027, ao entrar no orçamento, cria-se mais uma pressão adicional sobre as despesas discricionárias.

“No fim do ano passado, o governo anunciou um pacote de contenção de despesas com valor aproximado de R$ 40 bilhões. Para evitar uma mudança de regras, seria preciso fazer um pacote três vezes maior de 2026 para 2027”, comparou Bittencourt.

 

Este conteúdo foi originalmente publicado em Despesa livre no orçamento cai a zero em 2029; economistas veem “colapso” no site CNN Brasil.

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