Vereador bolsonarista de Curitiba Eder Borges emprega enteada como chefe de gabinete por R$ 17 mil

No Dia dos Namorados de 2022, o bolsonarista Eder Borges, vereador do PL em Curitiba, conhecido pelo tom agressivo em seus posicionamentos, fez uma rara demonstração de afeto nas redes sociais. “O gelo do inverno é tão bom quando a cama é quente”, escreveu na legenda de uma foto romântica ao lado da companheira, a psicóloga Andreia Gois Maciel, 47.

No mês seguinte veio a primeira nomeação. Victoria Lauren Maciel de Almeida, filha de Andreia, que tinha apenas 20 anos, foi contratada como chefe do gabinete de Borges, com um salário-base bruto de R$ 17.685,33.

Desde então, ela acompanha as agendas do vereador junto com a mãe. Nas redes sociais, o parlamentar exibe a companheira e a enteada ao lado de outros funcionários do gabinete. Em uma das publicações, escreveu: “Equipe eficiente e patriota”. 

Andreia nunca teve o cargo de assessora formalizado pelo mandato de Borges, mas sua atuação não é segredo. Ela faz parte do grupo de trabalho dos assessores da Câmara Municipal de Curitiba no WhatsApp.

Sua remuneração, porém, não vem do Poder Legislativo. Em fevereiro de 2025, em decreto assinado pelo prefeito Eduardo Pimentel, do PSD, a psicóloga foi nomeada para o cargo de Gestora Pública Municipal III no Instituto Municipal de Turismo, órgão presidido por José Luiz Velloso, do PL, colega de partido de Borges. 

A nomeação não a impediu de continuar assessorando o companheiro. Em vídeos obtidos pelo Intercept Brasil, Andreia aparece filmando Borges em sessão na Câmara, na manhã de 2 de abril. 

Segundo especialistas ouvidos pelo Intercept, há indícios de que a nomeação de Victoria para o cargo de chefe de gabinete, além da atuação informal de Andreia como assessora de Borges, violam princípios básicos da administração pública, como a moralidade, a impessoalidade e a eficiência, previstos no artigo 37 da Constituição Federal.

As condutas podem configurar improbidade administrativa e quebra de decoro parlamentar, violações que podem levar à cassação do mandato.

Atualmente, existe um pedido de cassação do vereador, ​protocolado pela vereadora Giorgia Prates, do PT, por quebra de decoro parlamentar. A representação foi protocolada na semana passada, após Borges, durante uma sessão plenária, afirmar que a Ku Klux Klan surgiu para “desarmar os negros norte-americanos”, em uma tentativa de defender seu projeto que institui o Dia Municipal dos Colecionadores, Atiradores e Caçadores.

Prates considerou a declaração uma relativização de crimes racistas históricos e uma ofensa direta à sua identidade como mulher negra. 

Além disso, a vereadora destacou que foi alvo de ataques pessoais por parte de Borges, que a acusou de “mau-caratismo” e “falta de neurônio”, o que, segundo ela, configura desrespeito aos princípios constitucionais de igualdade e dignidade humana, justificando o pedido de cassação por violação ao Código de Ética da Câmara. ​

Contratação pode configurar nepotismo e desvio de função

São raras as aparições públicas de Andreia e Eder Borges como casal. Em um episódio recente, o vereador se referiu à mulher como ‘minha assessora’.

Em 10 de maio de 2024, Andreia registrou um boletim de ocorrência por agressão na 2ª Central Integrada de Flagrantes da Polícia Civil do Paraná. Ela relatou à polícia que estava em agenda com Eder Borges no centro de Curitiba, quando uma “moradora de rua” iniciou uma discussão e desferiu um soco em seu ouvido esquerdo.

A versão do vereador é semelhante. “Estávamos filmando uma situação de moradores de rua na Praça Osório, com vários colchões encostados na parede, quando surgiu a senhora muito agressiva, xingando, jogando água na Andreia, depois jogou um banco de plástico e finalmente desferiu um soco no rosto da Andreia”, disse Borges, de acordo com o termo circunstanciado.

Na delegacia, Andreia e Eder declararam o mesmo endereço residencial — um condomínio na Rua XV de Novembro, no centro da cidade — mas optaram por não informar o estado civil.

Vereador chamou Andreia de ‘minha assessora’ ao descrever o ocorrido.

O episódio foi registrado pelo portal Banda B, que descreveu Andreia como “assessora” do vereador. 

De acordo com o advogado Clóvis Costa, especialista em direito público, a contratação de Victoria como chefe de gabinete caracteriza nepotismo direto, proibido pela Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal. 

O texto veda a nomeação de cônjuges, companheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade para cargos de confiança na administração pública.

“Ainda que não haja documento formalizando a união estável, há fortes indícios: declaração de endereço comum em boletins de ocorrência, exposição pública em redes sociais e convivência reconhecida publicamente. São provas aceitas para caracterizar a relação de união estável”, explica Costa.

Além disso, a atuação de Andreia como assessora informal de Borges, enquanto ocupa um cargo em outro órgão, pode constituir desvio de função. “Trata-se de uma grave violação dos princípios da administração pública, podendo configurar improbidade administrativa e ensejar cassação do mandato”, acrescenta o advogado.

O doutor em Direito do Estado Clóvis Alberto Bertolini concorda. Ele também avalia que a nomeação de Victoria se enquadra como prática vedada pela súmula do STF. “Havendo elementos que indiquem união estável, a nomeação de enteada viola a moralidade e a impessoalidade exigidas pela Constituição”, reforça.

Sobre a atuação informal de Andreia, Bertolini aponta que o vereador pode responder por quebra de decoro parlamentar. “A prática é comum, mas nem por isso deixa de ser irregular. Permitir que alguém não nomeado atue como assessor infringe o regimento da Câmara”, alerta.

O Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Municipal de Curitiba prevê sanções que vão desde advertência até a cassação do mandato para parlamentares que pratiquem atos de improbidade administrativa ou atentem contra a dignidade da função.

O Intercept entrou em contato com o vereador Eder Borges, além de Andreia e Victoria, solicitando posicionamento a respeito das denúncias de nepotismo e desvio de função. Nenhuma das partes se pronunciou até a publicação. O espaço segue aberto.

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