Qual a idade certa para crianças terem acesso a telas?

Atualmente, é difícil encontrar uma criança que não esteja conectada a alguma tela com algum jogo ou assistindo a algum desenho. Também é raro avistar um adolescente sem um smartphone em sua mão. As novas gerações, que nasceram com a revolução digital, são hiperconectadas e essa realidade preocupa especialistas e pais devido aos impactos à saúde mental e física.

Recentemente, a morte de duas crianças, de 8 e 11 anos, relacionadas a desafios online, chamou a atenção de pais e da sociedade médica para os conteúdos acessados pelo público infantil. Ambas as vítimas haviam inalado aerossol em um desafio do desodorante.

Além disso, segundo uma pesquisa realizada em abril pelo Porto Digital, em parceria com a Offerwise, empresa especializada em estudos de mercado na América Latina e no universo hispânico, nove em cada 10 brasileiros acreditam que os jovens não têm apoio emocional e social suficiente nas redes sociais.

Outro trabalho recente, publicado neste mês na revista científica Nature Human Behavior, mostrou que adolescentes entre 11 e 19 anos com problemas de saúde mental passam mais tempo nas redes sociais do que aqueles sem transtornos.

É diante deste cenário que iniciativas como o Movimento Desconecta surgem. A organização visa reduzir, controlar e adiar o acesso a smartphones e redes sociais por crianças e adolescentes. Para isso, ela propõe um acordo coletivo para adiar a entrega do celular até, pelo menos, 14 anos e o acesso a redes sociais até, no mínimo, 16.

“Essas idades foram escolhidas pelo Movimento por serem as recomendações mais comuns feitas por especialistas em desenvolvimento infantil, por psicólogos e por todos os profissionais que trabalham com saúde mental e digital de crianças e adolescentes”, afirma Antonia Brandão Teixeira, co-fundadora e membro do Comitê Executivo do Movimento Desconecta à CNN.

Por que adiar o acesso às telas e às redes sociais?

De acordo com Lilian Vendrame, psicóloga e neuropsicóloga especialista em adolescência, é importante adiar o acesso às telas e às redes sociais por crianças para preservar o desenvolvimento cognitivo e social. Ela cita a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), que afirma que crianças menores de dois anos não devem ter acesso às telas, por exemplo, e que para crianças de dois a sete anos, esse acesso deve ser de apenas uma hora por dia.

“Hoje nós vemos crianças de até um ano com tablet na mão, podendo haver um prejuízo no processo de desenvolvimento cognitivo, de habilidade social, de memória e de atenção”, afirma à CNN. “Nessa faixa etária, a criança está desenvolvendo as sensações, tanto que o bebê coloca sempre a mão na boca. Se eu não abro espaço para o desenvolvimento da atenção e do pensamento, podem haver prejuízos”, completa.

Já no caso de crianças mais velhas, de dois a sete anos, e pré-adolescentes, o risco se encontra nos prejuízos ao desenvolvimento de habilidades sociais, de memória e de linguagem. “Se eu deixo uma criança o dia inteiro com um tablet, ela pode não ter a habilidade de memória desenvolvida”, completa. “No início da pré-adolescência, a habilidade social precisa ser desenvolvida no cara-a-cara”, afirma.

De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), as recomendações para uso de telas por faixa etária são:

  • Menores de 2 anos: nenhum contato com telas ou videogames;
  • Dos 2 aos 5 anos: até uma hora por dia;
  • Dos 6 aos 10 anos: entre uma e duas horas por dia;
  • Dos 11 aos 18 anos: entre duas e três horas por dia.

No entanto, Vendrame ressalta que é importante o papel dos pais e responsáveis na imposição de limites. “Existem livros infantis que falam sobre os limites de uso de telas, então acredito que falta muito, hoje, até no próprio adulto, termos noção desse limite”, considera. “É preciso que os pais tenham a consciência de ler e de conversar com seus filhos”, completa.

Meu filho já tem um smartphone. E agora?

No caso de pais que já permitiram o acesso às telas para crianças e adolescentes — e, nos casos de filhos que já possuem o próprio smartphone ou tablet para uso pessoal — é importante estar atento aos cuidados e medidas que podem protegê-los de eventuais perigos da internet e dos impactos das telas à saúde.

“Acredito que os pais que já deram o acesso às redes sociais fizeram isso sem saber de todos os malefícios. Até poucos anos atrás, não tínhamos tantas evidências em relação aos riscos. Hoje, eles estão claros”, afirma Teixeira. “Então, cabe a nós — pais, mães e famílias — nos informarmos e nos conscientizarmos desses malefícios”, completa.

Além disso, a co-fundadora do Movimento Desconecta considera importante as famílias apostarem em ferramentas de controle. “É importante, ao darmos esse dispositivo aos nossos filhos, termos esse controle. Existem ferramentas que nos ajudam, de alguma maneira, a controlar pelo menos o tempo de uso, bloquear acesso a site que não são adequados para crianças e adolescentes, limitar acesso a jogos que sabemos que são inseguros, e trocar conhecimentos com outros pais e outras famílias”, completa.

Somado a essas questões, Vendrame acrescenta que é preciso que os pais retomem antigos hábitos com os filhos. “Devido à hiperconectividade [que os adultos também estão inseridos, segundo a especialista], nós não ampliamos mais nosso olhar para a solução de problemas. É preciso fazer o exercício de olhar para trás, ver o que era feito antigamente e tentar adaptar isso para o mundo em que vivemos atualmente”, afirma.

Nesse sentido, é interessante retomar brincadeiras fora do ambiente digital, como jogos, brinquedos físicos, atividades ao ar livre, leituras, pinturas, entre outras atividades.

Sinais de alerta para os pais ficarem atentos

A série “Adolescência“, da Netflix, colocou à tona os perigos que as redes sociais podem oferecer aos adolescentes, como o cyberbullying. Para os pais do personagem principal da produção, a revelação de que o filho estaria sofrendo um tipo de violência na internet é chocante: eles não tinham noção das ideias nocivas às quais as crianças sob seus cuidados estão expostas e de como isso influencia suas vidas.

Apesar de fictícia, a narrativa escancara a possível desconexão que os pais podem ter de seus filhos na fase da adolescência, principalmente no que diz respeito a suas presenças nas redes sociais. Por isso, é importante que os responsáveis estejam atentos a sinais de alerta que indiquem prejuízos à saúde mental ou riscos comportamentais relacionados à internet.

De acordo com Vendrame e Teixeira, são eles:

  • Desinteresse pelos amigos ou por atividades ao ar livre;
  • Desinteresse pela prática de atividades físicas que, antes, eram praticadas;
  • Passar muitas horas dentro do quarto, na internet;
  • Maior irritabilidade ou reatividade;
  • Dificuldade de lidar com o não e com os limites impostos pelos pais;
  • Mudança de comportamento;
  • Mudança abrupta na forma de se vestir.

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Este conteúdo foi originalmente publicado em Qual a idade certa para crianças terem acesso a telas? no site CNN Brasil.

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