Itália aprova mudanças no reconhecimento da cidadania; entenda

Itália aprova mudanças no reconhecimento da cidadania; entenda

A Câmara dos Deputados da Itália aprovou, por 137 votos a favor e 83 contrários, o projeto que converte em lei ordinária o Decreto-Lei nº 36/2025, introduzindo mudanças no reconhecimento da cidadania italiana por descendência (jus sanguinis). A nova legislação, que já havia sido aprovada pelo Senado, deverá ser sancionada pelo presidente da República até o dia 27 de maio.

O texto final estabelece um novo limite geracional: a cidadania será reconhecida apenas a filhos e netos de italianos nascidos na Itália. Com isso, bisnetos e gerações posteriores ficam excluídos do direito automático, mesmo que disponham de documentação completa e autêntica da linha de sangue.

Entre os pontos mais controversos, está a aplicação retroativa da norma — que valerá inclusive para pessoas nascidas antes da entrada em vigor da lei. A medida, segundo juristas e associações de defesa dos direitos dos italianos no exterior, pode entrar em conflito com o princípio constitucional da irretroatividade das normas restritivas de direitos.

Argumenta-se que o direito à cidadania representa um status civil originado no nascimento e, por isso, não poderia ser modificado de forma retroativa por via legislativa ordinária.

Além disso, a nova lei exige que o genitor italiano nascido fora da Itália tenha residido no país por pelo menos dois anos consecutivos antes do nascimento do filho, como condição para transmitir a cidadania. A exigência, que não tem precedentes no ordenamento anterior, poderá dificultar o reconhecimento de novos cidadãos mesmo quando o vínculo sanguíneo é incontestável.

Segundo Filippo Marcon, delegado da Guardia d’Onore alle Reali Tombe del Pantheon para o Brasil, “a medida abre um perigoso precedente jurídico e cultural, ao criar uma distinção inédita entre cidadãos italianos reconhecidos: aqueles plenamente titulares dos direitos civis e aqueles impedidos de transmitir a cidadania aos próprios filhos por critérios de residência ou geração.

É uma divisão artificial e que contradiz o espírito histórico da cidadania italiana, baseada no sangue e na continuidade familiar. Desde sua fundação, a Itália optou conscientemente pelo princípio do ius sanguinis como critério definidor do pertencimento nacional, rejeitando a lógica puramente territorial do ius soli.

Revogar esse princípio não é apenas uma ruptura com o direito: é um atentado à memória de todos que se sacrificaram por uma pátria unida, incluindo o Padre da Pátria, Rei Vittorio Emanuele II, e os grandes artífices do Risorgimento — Giuseppe Garibaldi, Giuseppe Mazzini e o Conde de Cavour.”

Desde a entrada em vigor provisória do decreto, em 28 de março, consulados e prefeituras italianas suspenderam a abertura de novos processos administrativos. Agora, com a conversão definitiva em lei, o impacto será especialmente sentido na América Latina — e principalmente no Brasil, que abriga a maior comunidade ítalo-descendente do mundo, com mais de 30 milhões de pessoas com algum grau de ascendência italiana.

Entidades jurídicas e parlamentares da oposição já anunciaram que irão recorrer ao Tribunal Constitucional, solicitando o exame da legalidade e da compatibilidade da norma com os princípios fundamentais da Constituição da República Italiana.

Informações: Lorena Pelanda, com assessoria

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