COPs estimulam transição energética, mas analistas veem falta de celeridade

A transição energética está entre as principais pautas discutidas na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que será sediada no Brasil em novembro deste ano. A expectativa de especialistas é que haja debates sobre a aceleração dos investimentos em tecnologias limpas e renováveis.

Analistas ouvidos pela CNN, porém, apontam entraves para dar fôlego ao processo, como juros altos, dificuldades no financiamento e desigualdade no ritmo da transição em diferentes regiões do globo.

 

No último ano, a temperatura global ultrapassou, pela primeira vez, o limite de 1,5ºC estabelecido no Acordo de Paris, na COP21, em 2015. A emissão de gases de efeito estufa, principalmente o dióxido de carbono (CO2), é um dos maiores responsáveis pelo aquecimento global.

Felipe Salgado, sócio-diretor de descarbonização da KPMG, chama a atenção para a necessidade de investimentos em energias renováveis. Segundo ele, 3/4 das emissões globais de CO2 partem do setor de energia.

Em decisão histórica, a COP28, realizada em 2023, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, aprovou a transição dos combustíveis fósseis para fontes de energia limpa. O texto do balanço geral (global stocktake, na sigla em inglês) foi adotado por representantes de 198 países presentes na cúpula do clima.

Apesar do avanço, segundo Salgado, o relatório mostrou que o ritmo atual ainda é insuficiente diante do aumento de eventos climáticos extremos.

Para Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, debates sobre energia limpa e sustentável não tiveram grande avanço na COP29, realizada em 2024, em Baku, no Azerbaijão.

“Conseguimos manter o passo e isso é notável, considerando que essa transformação está acontecendo simultaneamente em centenas de países”, declarou a especialista.

Investimento em energia renovável avança no Brasil

O Brasil tem registrado um crescimento significativo nas energias renováveis em sua matriz elétrica e vem se consolidando como potência na transição energética, apontam os especialistas.

Com dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Unterstell aponta que os custos da energia renovável caíram no país desde 2010: 85% na solar e 55% na geração eólica.

Ao mesmo tempo, o uso de energia solar avançou 80% em dois anos, enquanto a eólica já responde por mais de 10% da produção elétrica nacional.

Entre as principais fontes de energias renováveis no Brasil, atualmente, estão solar, biomassa, eólica, hidrogênio. As hidrelétricas compõem 55% da matriz elétrica brasileira, enquanto as outras duas maiores fontes renováveis são a eólica (14,8%) e biomassa (8,4%).

Em 2023, as fontes renováveis atingiram 49,1% na matriz energética brasileira, segundo Balanço Energético Nacional (BEN) 2024. Em 2021, o percentual de fontes renováveis na matriz energética brasileira era de 45%.

Avanço da transição energética global é desigual

Apesar do avanço, a transição energética ao redor do mundo ainda ocorre de forma desigual e insuficiente entre os países, ressaltam os especialistas.

Enquanto China e Índia têm instalado energias renováveis em um ritmo superior aos demais países, a Indonésia e África do Sul, por exemplo, enfrentam dificuldades para acelerar a transição energética, explica Unterstell.

Salgado complementa ao citar que há um desafio em fazer com que países e empresas entendam o conceito de transição energética justa.

“Quando a gente está falando de renováveis, a gente está falando de mudar a matriz energética daquele país ou daquela empresa, ou daquela cidade para ser menos carbono intensiva. Porém, há uma série de locais no mundo que a população não tem acesso à energia”, disse.

Altos juros e financiamento climático são desafios

À espera da COP30, outros entraves preocupam o avanço da transição energética, como os altos juros, insuficiência do financiamento, além da necessidade de acelerar o processo.

Segundo Unterstell, o maior desafio para a transição energética é o custo do capital. “Nos países em desenvolvimento, os juros são altos, os riscos são mal precificados e os projetos sofrem para obter financiamento.”

Salgado também chama a atenção para outro ponto importante, na sua visão, que é o avanço na eficiência energética — ou seja, tirar o maior proveito com o menor custo.

“Um dos resultados da COP28 foi o compromisso de triplicar a capacidade instalada de energias renováveis e também dobrar a questão da eficiência energética”, destacou.

As incertezas sobre a origem dos recursos para acelerar a transição energética também é um fator preocupante em meio a proximidade da COP30.

“A COP de Baku foi chamada da COP do financiamento. Então, como a gente viabiliza fundos ou recursos para essa transição energética? O grande ponto é de onde virão os recursos para a gente acelerar a transição”, afirmou Salgado.

Segundo o especialista, o caminho está claro, porém, é necessário acelerar o processo, além de encontrar meios para financiar a transição energética.

“Eventos climáticos extremos são cada vez mais frequentes, e isso traz uma série de consequências para a sociedade, os negócios e a população como um todo”, acrescentou.

Setor privado deve agir para transição energética

Na visão dos especialistas, o setor privado é protagonista na expansão das tecnologias limpas e renováveis, mas há desafios nos mecanismos de financiamento. 

“Cerca de 75% dos investimentos em energias renováveis hoje vêm do setor privado. O capital, porém, ainda flui majoritariamente para países ricos ou mercados com baixa percepção de risco”, declarou Unterstell.

Salgado também explica que é urgente o investimento privado em energias renováveis e na descarbonização, dado o contexto atual e a necessidade de recursos.

“As empresas são pressionadas por acionistas, elas são pressionadas por resultado, mas se não olharem a agenda climática, principalmente a agenda de adaptação, com muita clareza e de uma forma muito estratégica, elas vão deixar de operar no médio prazo”.

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