Retratado na cultura popular como uma demonstração de amor ou zelo, o ciúme pode até tirar o nosso sono. Porém um estudo recente mostra que a coisa é um pouco mais complexa do que parece.
De acordo com os autores, uma dupla de cientistas da Universidade de Montanaque apresentou seus resultados na reunião anual da Associated Professional Sleep Societies (SLEEP), as pessoas que têm ansiedade em relações afetivas — motivada por medo de serem rejeitadas, por insegurança constante ou por baixa autoestima em relacionamentos — tendem a dormir pior.
E, quando dormem mal, acabam ficando mais vulneráveis a sentimentos de ciúme no dia a dia. Em outras palavras, trata-se de um ciclo vicioso emocional no qual a insegurança leva à má qualidade do sono, que intensifica o ciúme, que agrava a insegurança, em um circuito difícil de ser quebrado.
Para o principal autor do estudo, Giovanni Alvarado, doutorando na Universidade Estadual de Montana, nos Estados Unidos, “o sono ruim não estava uniformemente relacionado a todos os resultados socioemocionais negativos”. Ou seja, as emoções são moldadas pelo estilo de apego.
Segundo a Academia Americana de Medicina do Sono (AASM), uma noite bem dormida é essencial para a saúde. E isso inclui não apenas dormir por tempo suficiente (pelo menos sete horas para adultos), mas também manter qualidade e regularidade, fatores que impactam nossas experiências socioemocionais diárias.
Analisando a correlação entre apego, qualidade do sono e ciúme

Para testar suas hipóteses, os autores acompanharam 68 jovens adultos por duas semanas. Usando instrumentos como o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh e um questionário sobre relacionamentos, os participantes preencheram autorrelatos diários sobre experiências emocionais e comportamentos sociais.
As análises mostraram uma correlação significativa entre apego ansioso e a deterioração da qualidade do sono. Indivíduos com maior ansiedade de apego tiveram padrões de sono perturbados. Distúrbios do sono, por sua vez, se manifestaram em forma de insegurança emocional em relacionamentos, criando um ciclo.
Essa má qualidade do sono resultou em redução dos comportamentos de aproximação social. Ou seja, os participantes que dormiam mal evitavam interações sociais e conexões interpessoais, o que levou ao aumento de sentimentos negativos como culpa e ansiedade social.
A relação entre qualidade do sono e sentimentos de inveja foi moderada pela ansiedade de apego. Esse padrão se apresenta em pessoas que têm medo de abandono e rejeição, buscam reafirmação do(a) parceiro(a), são hipersensíveis a distanciamento emocional e dependentes da aprovação dos outros.
Os resultados revelaram uma interação complexa entre padrões de apego, qualidade do sono e funcionamento social. Intervenções voltadas à melhoria do sono podem beneficiar indivíduos com ansiedade de apego muito alta. Compreender essas conexões pode levar a abordagens terapêuticas mais eficazes.
Implicações do estudo para novas intervenções terapêuticas

A pesquisa demonstrou uma relação clara entre a má qualidade do sono e a ansiedade de apego nos participantes. Essa conexão mostrou como o descanso inadequado afeta profundamente nossa capacidade de manter relacionamentos saudáveis e equilibrados emocionalmente.
Ao mesmo tempo, o estudo identificou que problemas de sono intensificam sentimentos de inveja e ciúme em contextos sociais. No entanto, esse efeito se manifestou apenas entre indivíduos mais propensos à ansiedade relacional. Ou seja, a privação de sono depende dos traços individuais de personalidade e insegurança.
As descobertas iniciais indicam que, quando se trata de relacionamentos, nem todo mundo reage da mesma forma à falta de sono: algumas pessoas ficam mais irritadas, ciumentas ou inseguras quando dormem mal, enquanto outras conseguem manter o equilíbrio emocional, mesmo cansadas.
A diferença está no estilo de apego de cada uma: aquelas com apego inseguro, ou seja, que já têm medo de abandono ou necessidade de reafirmação, são as mais afetadas pela falta de sono. Quando ficam cansadas, tornam-se ainda mais ansiosas, sensíveis a sinais de rejeição e emocionalmente desreguladas.
A pesquisa permite que profissionais criem tratamentos personalizados para pessoas com problemas de sono. Pessoas com apego seguro (mais confiantes) podem receber o tratamento padrão para insônia, mas as com apego ansioso exigem estratégias para lidar com o ciúme e a insegurança.
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