ONG realiza primeiro censo da população da jandaia-verdadeira no Ceará


Realizado em Fortaleza, levantamento contabilizou 47 indivíduos em uma pequena área. Moradores auxiliam na proteção dos ninhos e mantém relação de afeto com a ave, que está ameaçada no estado. Jandaias-verdadeiras registradas em terreno particular na cidade de Fortaleza (CE)
Suzi Haras
Para surpresa dos moradores de um bairro em Fortaleza (CE), um bando numeroso de jandaias-verdadeiras (Aratinga Jandaya) passou a ocupar e se reproduzir em um terreno da vizinhança. A movimentação foi tamanha que atraiu olhares de biólogos.
Pensando em construir um inventário, técnicos da ONG Aquasis realizaram o primeiro censo da espécie no Ceará, que contabilizou 47 indivíduos residindo no terreno em setembro. A ave é considerada ameaçada de extinção pela Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima (Sema) do estado.
“Mais do que saber quantos indivíduos ocorrem naquele lugar, os censos periódicos ajudam a acompanhar tendências populacionais. Essa é intenção principal, e a partir disso, várias ações podem ser adotadas: fiscalizações, translocações, colocação de ninhos artificiais, etc”, comenta Fábio Nunes, biólogo e gerente de programa da ONG Aquasis.
A ação contou com apoio do Parque Arvorar, novo parque temático do Beach Park, e mobilizou 20 voluntários. A contagem ocorreu antes do sol nascer, das 5h às 6h, e no final do dia, das 16h30 às 17h50.
Embora seja comum em outras partes do país, ave é considerada ameaçada no Ceará
Suzi Haras
Os dados do censo serão compartilhados com os órgãos ambientais, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) para auxiliar no monitoramento de tendências populacionais e fiscalizações.
“As informações servirão também para reforçar a criação de uma área protegida para as jandaias, e também deverão ajudar no manejo populacional dessa espécie, pois uma eventual limitação de ninhos em locais seguros poderá ser contornada com ninhos artificiais, por exemplo, para que a população continue aumentando”, acrescenta Fábio.
Bióloga grava bando de jandaias-verdadeiras em Fortaleza, no Ceará
No Brasil, segundo o Sistema de Avaliação do Risco de Extinção da Biodiversidade (Salve) do ICMBio, a espécie é classificada como Menos Preocupante (LC).
“Embora haja indícios de decréscimo populacional em áreas como o sul do Maranhão e Ceará, a espécie ainda é relativamente comum no leste da Amazônia, onde aparentemente vem aumentando em número, devido à expansão de habitats adequados em consequência da degradação da floresta contínua”, afirma o relatório.
“A caça e captura é uma forte ameaça, porém seu efeito na população ainda é mal compreendido e, considerando a disponibilidade de habitat em sua ampla distribuição, não há indícios de que a espécie possa atingir um dos limiares do risco da extinção em um futuro próximo”, finaliza o documento.
Relação com moradores
Suzi Haras é bióloga e se envolveu intimamente com as jandaias. Após se mudar para o bairro onde o terreno se encontra, ela fazia caminhada quando começou a reparar em pequenas cabeças saindo das carnaúbas plantadas no local.
“Vi um filhote sendo alimentado, vi cópula. E uma coisa que eu achei mais estranha é que elas não se incomodam por nada. Os moradores fazem caminhada, tem futebol todos os finais de semana nesse campo e elas não têm medo”, comenta Suzi.
Reunião com moradores do bairro onde está localizado o terreno das jandaias
Arquivo pessoal
Anos atrás, a jandaia-verdadeira já teve o Ceará como refúgio, mas passou por severo processo de defaunação. Até pouco tempo, as últimas populações conhecidas no estado eram consideradas pequenas e vulneráveis.
Segundo a bióloga, de início, os moradores não conheciam a história e a importância da jandaia na região. Quando as observava com o binóculo, Suzi respondia perguntas sobre a ave feitas por eles. Uma relação próxima começou a surgir entre pessoas e jandaias.
Suzy costuma observar as jandaias com binóculo
Arquivo pessoal
Com apoio da associação de moradores, a pesquisadora organizou uma reunião no bairro, falou com o dono do terreno e informou o Ibama e a Semace sobre aquela população de aves. Os moradores se envolveram tanto que passaram a denunciar qualquer um que tentasse capturar ou fazer mal às aves.
“Os moradores abraçaram a causa. De vez em quando eu recebo uma mensagem de denúncias. Então está tendo essa mobilização. Com cuidado, a gente fez um mutirão de limpeza porque o local tinha muito lixo e a gente tá tentando conscientizar a população e os catadores a não jogar lixo”, conta Suzi Haras.
Para manter as jandaias e seus ninhos seguros da caça ilegal, principal ameaça à espécie no Ceará, os moradores e pesquisadores envolvidos buscam parcerias com ONGs e órgãos públicos para tentar transformar a área em uma unidade de conservação.
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