Cassio Scapin: “Não vivi esse processo de sair do armário”

Cassio Scapin, 61, sempre se viu muito bem resolvido quanto à sua sexualidade. O ator — que ficou eternizado como Nino do “Castelo Rá-Tim-Bum” — explica em entrevista exclusiva à CNN Brasil que sentia orgulho de ser diferente dos outros meninos antes mesmo que essa palavra fosse usada como forma de empoderamento das gerações futuras.

“Não vivi esse processo de sair do armário. Nunca comprei os valores heterossexuais dessa sociedade, não era parâmetro para mim. Comecei a fazer teatro ainda cedo, aos 14 anos, lia muito, inclusive sobre a homossexualidade, então me sentia só a exceção. Não tinha representatividade e era legal estar na zona de diferenciação. Me dava um orgulho, antes mesmo que essa palavra fosse usada como forma de empoderamento, mesmo com tudo de horroroso que acontecia”, lembra.

O artista — que completou 61 anos recentemente — detalha que, na juventude, gostava de frequentar boates LGBTQIA+, e lia muitos livros que faziam sua mente viajar para longe dos preconceitos. Assim, ele transformava a possibilidade de se sentir excluído da sociedade em força e transgressão.

“Eu ia para a porta de uma boate, que se chamava Medieval, para ver as pessoas, achava aquilo tudo muito incrível. Eu lia muitas obras do gênero, como Pier Paolo Pasolini, o que dava um ‘tilt’ na cabeça. Também li Tennessee Williams muito cedo, que faziam uma exarcebação da sexualidade, então eu me identificava pela literatura que me trouxe esse orgulho, esse lugar transgressor. Isso me dava um sentido de transgredir. Era uma sensação fora do padrão, que me dava uma grande força interna.”

Ele diz que hoje não se sente no lugar de ser uma representatividade para as novas gerações de homens gays, mesmo aqueles que cresceram assistindo o seriado da TV Cultura.

“Não que eu seja exemplo para ninguém! [risos]… eu só sigo o meu caminho e tento ser o mais coerente e correto com meu pensamento e minha ação. Tento ao máximo deixar meu discurso ser próximo à minha atitude de vida. Tento diminuir o vácuo entre o que fala e faz”, comenta.

O menino bruxo

Por falar na época do “Castelo Rá-Tim-Bum“, Cassio declara que não havia uma imposição por parte da produção para “não parecer gay”. Ele entrou para o elenco com apenas 28 anos de idade, todos os episódios foram gravados em um espaço de um ano e meio e, posteriormente começaram a serem exibidos. Enquanto isso, ele vivia a vida como qualquer trabalhador.

“Acho que nunca ‘chutei tanto o balde’ quanto naquela época. Era o período que eu mais me sentia livre, sem amarras. A gente gravou o ‘Castelo’, nada ia para o ar, trabalhava feito um louco, então eu aproveitava a vida. Eu era jovem, então chutava o balde. Nunca me preocupei com isso. Eu ia para as baladas, mas se alguém pedia para tirar fotos comigo, eu só escondia os copos com bebidas. Eu desaparia com o copo para tirar a foto. Era um comprometimento”, afirma. “Eu era frequentador do [boate] Massivo, da Magiqueen. Depois que o ‘Castelo’ virou uma epidemia, eu fui capa da Veja como os ‘clubers’ da noite com outros ícones da noite gay paulistana. Éramos a moçada da noite! Para mim era normal, nunca me senti tolido por isso”.

O personagem Nino eternizou Cassio na memória popular e é comum que os fãs do seriado o parem nas ruas para declararem o amor que sentem por ele. O artista conta que essas pessoas tremem, choram e pedem abraços e fotos para registrarem o momento único com o ídolo de infância.

“Vejo homens barbados em lágrimas… eu acolho, abraço, me sensibilizo, acho legal, me toco, mas entendi que isso é algo que pertence a ela. É um benefício que ela se fez, é uma lembrança boa dela e eu sou apenas o catalisador. Esta pessoa que é legal! Não tenho responsabilidade pelo bem causado ao outro… esse bem foi ele mesmo que fez! Se isso foi importante para ele, cresceu feliz, que bom! Eu só estava fazendo meu trabalho e sendo feliz também. Se isso resultou em algo positivo, talvez o trabalho seja 80% dele e só 20% meu. Não fiz com a intenção de mudar a vida de alguém.”

Cassio pontua que não se sente incomodado por ser lembrado sempre como “o Nino do Castelo”, mesmo que tenha um currículo extenso na televisão e no teatro. Ele prefere pensar que este foi um trabalho positivo que será eternamente lembrado por milhões de pessoas pelo Brasil afora.

“Quando as pessoas me dizem ‘eu sei que você fez muita coisa, mas o Nino é demais’… o que posso fazer? É algo que foi bom… triste se eu não tivesse feito nada que ficasse marcado. Acho que é um resultado positivo de um trabalho. À princípio, essa briga não é nem com a pessoa, mas com o Nino [risos]… eu só falo para ‘ele’ ficar um pouco quieto. Foi um trabalho que resultou positivamente, então acho bom”, finaliza.

Este conteúdo foi originalmente publicado em Cassio Scapin: “Não vivi esse processo de sair do armário” no site CNN Brasil.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.