Theatro Municipal vive impasse com o fim de contratos temporários de 120 funcionários; novo concurso depende do Regime de Recuperação Fiscal


Atualmente, dos 732 cargos efetivos previstos na instituição, apenas 217 estão ocupados, sendo 120 temporários, com contratos encerrando no dia 30 de junho. Governo do Estado do RJ fala em concurso para 110 novos servidores. Autorização depende de avaliação da Comissão de Acompanhamento do Regime de Recuperação Fiscal da Secretaria de Fazenda. Theatro Municipal do Rio foi inaugurado em 1909 e inspirado na Opera Garnier, de Paris
Marcos Serra Lima/g1
O Theatro Municipal do Rio de Janeiro, um dos principais símbolos culturais do país, enfrenta um impasse com o fim dos contratos temporários de 120 funcionários no próximo mês. Parlamentares temem que a falta de profissionais possa, em última instância, interromper as atividades no local a partir de 1º de julho.
O alerta foi feito durante uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) na semana passada. O Governo do Rio de Janeiro estuda a realização de um concurso público para contratar 110 servidores, mas ainda depende da adaptação da proposta ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). (Saiba mais detalhes na reportagem).
No encontro na Alerj, deputados e funcionários da Cultura debateram a urgência de um novo concurso público para preencher os 505 cargos vagos na Fundação Theatro Municipal.
Atualmente, dos 732 cargos efetivos previstos na instituição, apenas 217 estão ocupados. A crise é agravada pelo fim dos contratos de profissionais temporários em 30 de junho.
“Hoje, a instituição opera no limite mínimo necessário para seu funcionamento, e a continuidade de suas atividades depende de uma resposta rápida e efetiva do poder público”, afirmou o deputado Flávio Serafini (Psol).
Presidente da Fundação Theatro Municipal, Clara Paulino, destacou a importância de garantir uma solução para a permanência dos profissionais temporários até o fim da temporada.
“Entendo que uma nova contratação temporária não é viável, e a exclusão dos atuais contratados do processo seletivo compromete a qualidade dos espetáculos. Estamos trabalhando para viabilizar o concurso e buscar alternativas que assegurem a manutenção dos profissionais em atividade”, afirmou Paulino durante a audiência na Alerj.
“Trabalhar no Theatro é o sonho de muita gente. E agora estamos nessa demanda novamente, com um contrato que se encerra em 45 dias. Parece um pesadelo,” disse Pedro Olivero, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Entidades Culturais Públicas do Estado do Rio de Janeiro (Sintac-RJ).
Temporários x concurso público
O Theatro Municipal conta com 120 funcionários temporários, responsáveis por suprir parte da demanda operacional do teatro. Sem a renovação desses vínculos ou a chegada de novos servidores, a casa corre o risco de paralisar suas atividades.
Segundo o deputado estadual Flavio Serafini (Psol), presidente da Comissão de Servidores da Alerj, a ideia do parlamento é estender os contratos temporários e cobrar a realização do concurso por parte do governo.
“A Casa Civil (Governo do Estado) saiu daqui com o compromisso de acelerar o processo para que se faça um contrato emergencial com os temporários e garantir à população do estado que o Theatro siga funcionando”, comentou Serafini.
O acordo do governo com o parlamento é que, até o início de junho, o Poder Executivo envie uma mensagem para ser votada na Alerj, com o pedido de urgência, autorizando a prorrogação dos contratos temporários dos funcionários do Theatro Municipal. A ideia emergencial daria tempo para o governo realizar o concurso e habilitar os novos servidores, sem paralizar a programação cultural.
O deputado Luiz Paulo (PSD), que também esteve na audiência, cobrou um novo concurso e a criação de um cadastro de reserva com até 350 vagas adicionais, visando evitar novos desabastecimentos.
“É fundamental o concurso público, porque se não tem concurso público não tem transmissão desse legado. Tem que acelerar este concurso. Se fizer um concurso para 100, vão se inscrever 500. Se passarem 350, 250 vão estar num cadastro de reserva. Na medida que tem a possibilidade financeira, você vai chamando. É assim em todas as instituições”, analisou Luiz Paulo.
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O último concurso do Theatro ocorreu em 2013 e não preencheu todas as posições. Desde então, parte do quadro artístico foi contratada via processos seletivos simplificados.
Atualmente, 120 profissionais temporários mantêm a instituição em funcionamento, mas seus contratos, já prorrogados por três anos, expiram em junho de 2025 — o que não resolve a emergência de curto prazo.
Regime de Recuperação Fiscal pode atrapalhar
Em contato com o g1, a Secretaria de Estado da Casa Civil informou que o novo concurso já tem pareceres técnicos aprovados e aguarda análise da Comissão de Acompanhamento do Regime de Recuperação Fiscal da Secretaria de Fazenda.
A pasta não detalhou prazos, mas reforçou o compromisso de viabilizar a contratação. A secretaria disse que pretende realizar um concurso para preencher 110 vagas.
“Atualmente, são 120 contratados temporários e o concurso previsto será para preenchimento de 110 cargos”, dizia um trecho da nota enviada pela Secretaria de Estado da Casa Civil.
Apesar da aprovação interna para um novo concurso público, a ideia pode não sair do papel, visto que o estado segue em Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e uma das regras impõe condições rígidas para realizar novas contratações.
O Regime de Recuperação Fiscal (RRF) permite a suspensão temporária do pagamento de dívidas do estado com a União, flexibiliza regras fiscais e concede benefícios como operações de crédito, em troca da adoção de medidas de ajuste, como teto de gastos vinculado à inflação, reformas previdenciárias e controle de despesas.
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O RRF não impede totalmente a realização de concursos públicos, mas impõe condições específicas para sua realização. A situação foi definida após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023, que flexibilizou restrições do regime para permitir concursos em casos de reposição de cargos vagos, desde que alinhados ao Plano de Recuperação Fiscal e com mecanismos de compensação financeira.
A Fundação Theatro Municipal e o Governo do Rio de Janeiro asseguram que a programação do Theatro Municipal para 2025 será mantida, incluindo espetáculos e eventos já planejados.
A afirmação dos gestores, porém, contrasta com o cenário de incerteza para os próximos meses, que depende da efetiva reposição de pessoal ou extensão dos contratos temporários que se encerram em 30 de junho.
A fachada do Theatro Municipal do Rio
Marcos Serra Lima/g1
Enquanto o impasse persiste, artistas, trabalhadores e amantes da cultura acompanham com apreensão o desfecho das negociações, temendo o silêncio nos palcos de um patrimônio centenário.
A presidente da Associação dos Corpos Artísticos e Técnicos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro (Acobatemurj), Priscila Albuquerque, comentou sobre a relevância histórica do Theatro e a necessidade de garantir a continuidade do corpo artístico por meio da realização de concursos públicos.
“A cultura brasileira é rica, diversa, profundamente enraizada na nossa história. O Theatro Municipal, como símbolo da arte nacional, desempenha um papel essencial nesse contexto. É fundamental assegurar a permanência do coro, do balé, da orquestra e dos técnicos. Esses concursos garantem não apenas a experiência técnica e artística, mas também a preservação de uma identidade construída ao longo de décadas por artistas que dedicaram suas vidas à cultura do nosso país. É por meio deles que conseguimos formar novas gerações e oferecer ao público um trabalho coletivo de altíssima qualidade, acessível e digno da nossa tradição”, destacou.
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